quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Mostra Atalante apresenta Cineastas Alemães

Parte das celebrações dos 45 anos da Cinemateca de Curitiba, o Coletivo Atalante apresenta uma mostra dedicada aos cineastas da Alemanha em seis sessões seguidas de debates em outubro, todas exibições em 35mm do acervo da Cinemateca.


Um mergulho tanto em uma filmografia como no acervo de uma instituição, acreditamos que se trata de uma oportunidade para (re)descobrir o fervilhante cinema realizado na Alemanha na virada dos anos 1970 e 1980 como de valorizar o trabalho de guarda da segunda cinemateca mais antiga do Brasil.


Todas as sessões são gratuitas!

Programação completa:

01/10, sábado
às 16h:
Os Anos de Chumbo, de Margarethe Von Trotta

(Die Bleierne Zeit, 1981, ALE, 106 min, drama, 14 anos)
Direção: Margarethe Von Trotta. Com Jutta Lampe, Barbara Sukowa, Rüdiger Vogler

Juliane (Jutta Lampe) e Marianne (Barbara Sukowa), filhas de um pastor protestante, se afastam da austeridade religiosa de seus pais e tentam mudar a sociedade. Cada uma escolhe uma maneira diferente: enquanto Juliane é uma jornalista engajada, sua irmã faz parte de uma organização terrorista. Quando Marianne é presa pelas autoridades, Juliane se torna seu único vínculo com o mundo fora da prisão.

 

01/10, sábado
às 19h:
Rosa Luxemburgo, de Margarethe Von Trotta

(Rosa Luxemburg, 1986, ALE, 121 min., drama/biografia, 14 anos)

Direção: Margarethe Von Trotta. Com Barbara Sukowa, Daniel Olbrychski, Otto Sander

Nascida na Polônia e doutora em Ciências Econômicas, Rosa Luxemburgo torna-se uma das grandes líderes do movimento operário revolucionário alemão, adere ao Partido Social-Democrata alemão em 1898 e em 1914, rompe violentamente com essa agremiação. Rosa, a Vermelha, como era conhecida, visceralmente internacionalista e antibelicista, condena como uma traição o apoio dos social-democratas à deflagração da Primeira Guerra Mundial. Ao lado de Léo Jogiches e do revolucionário Karl Liebknecht, junto com o qual fundou a Liga Spartacus, embrião do futuro Partido Comunista Alemão, a militante se embrenha cada vez mais no movimento de massas, passando longos períodos na prisão.

 

02/10, domingo
às 16h: Lili Marlene
, de Rainer Werner Fassbinder

(Lili Marleen, 1981, ALE, 120 min., drama, 16 anos)
Direção: Rainer Werner Fassbinder.
Com Hanna Schygulla, Giancarlo Giannini, Mel Ferrer

Fassbinder utiliza a história da mais popular canção da Segunda Guerra - Lili Marlene - para construir uma alegoria sobre as intrincadas relações entre a arte, o amor e o poder nos anos negros da Alemanha nazista.

 

08/10, sábado
às 16h: O Amigo Americano
, de Wim Wenders

(Der amerikanische Freund, 1977, ALE, 128 min., policial, 14 anos)

Direção: Wim Wenders. Com Bruno Ganz, Dennis Hopper, Nicholas Ray.

Jonathan Zimmermann (Bruno Ganz) é um pacato moldurista alemão, que tem um áspero contato com um americano, Tom Ripley (Dennis Hopper), em um leilão. Jonathan desconfia que está sofrendo de uma moléstia incurável e recebe uma inacreditável proposta de um gângster: matar um bandido rival, recebendo em troca uma quantia que permitisse que sua família vivesse tranquila após sua morte. Dividido entre a angústia de estar com os dias contados e a hesitação em se tornar um assassino, Jonathan cada vez mais se envolve na trama. Porém o que ele não sabe é que quem está por trás dela é justamente Tom Ripley.

 

08/10, sábado
às 19h: Paris, Texas
, de Wim Wenders

(Paris, Texas, 1984, ALE/FRA/RU, 145 min., drama, 16 anos)
Direção: Wim Wenders. Com Harry Dean Stanton, Natassja Kinski, Dean Stockwell.
Um homem (Harry Dean Stanton) é encontrado exausto e sem memória, em um deserto ao sul dos EUA. Aos poucos ele vai se recordando de sua vida, sendo acolhido pelo irmão Walt (Dean Stockwell), que é casado com Anne (Aurore Clément). Com eles vive também Alex, filho do homem sem memória, que aos poucos volta a se identificar com o pai.

 

09/10, domingo
às 16h: Fitzcarraldo
, de Werner Herzog

(Fitzcarraldo, 1982, ALE, 157 min., aventura, 14 anos)

Direção: Werner Herzog. Com Klaus Kinski, José Lewgoy, Claudia Cardinale

Brian Sweeney Fitzgerald ("Fitzcarraldo", na pronúncia dos nativos), fã do tenor italiano Enrico Caruso, sonha em construir uma casa de ópera na remota cidade de Iquitos, no alto Amazonas. Fitzgerald já havia investido numa Estrada de Ferro, a Transandina, e falhara. Tentava conseguir os recursos com um novo empreendimento, uma fábrica de gelo. Graças a esses negócios improváveis, ele foi chamado de "Conquistador do Inútil". Finalmente, consegue dinheiro de sua amante, dona do bordel da cidade, e compra um grande barco fluvial, tentando encontrar uma nova rota para transportar a borracha, de terras que conseguiu a autorização governamental para explorar. Com o navio, Fitzgerald se dirige ao local onde quer explorar a borracha. Alucinado, transpõe morros e matas com o barco, à custa de vidas humanas e muito sofrimento.


Serviço:

Mostra Atalante apresenta Cineastas Alemães: sessões em 35mm do acervo da Cinemateca de Curitiba
Dias 01, 02, 08 e 09 de outubro
Às 16h e às 19h

Na Cinemateca de Curitiba
(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174- São Francisco)
(41) 3321-3552.

ENTRADA FRANCA! Sala sujeita à lotação. Recomendamos o uso de máscara PFF2 durante o evento.


PROJETO REALIZADO COM RECURSOS DO PROGRAMA DE APOIO E INCENTIVO À CULTURA – FUNDAÇÃO CULTURAL DE CURITIBA E DA PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA.

Realização: Coletivo Atalante
Incentivo: Fundação Cultural de Curitiba e Prefeitura Municipal de Curitiba

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Clube do Filme: A Inglesa e o Duque

O Clube do Filme do Atalante continua em atividade no formato virtual. A cada mês nos reunimos na quarta quarta-feira para a discussão de um filme e textos relacionados, sempre gratuitamente.

Em 2022 iremos explorar a filmografia do cineasta francês Éric Rohmer (1920-2010)!

Em setembro, continuamos explorando a obra tardia do diretor com "A Inglesa e o Duque" (
L'Anglaise et le Duc, 2001).

Dessa forma, o cinema é muito mais do que uma linguagem: sua função não é dizer “de outra maneira” o que já foi dito. Muitas vezes ele foi tido como um tipo de mímica refinada, um meio de exprimir, pelo gesto e pela alusão, o que o romance e o teatro pintavam pelo discurso. O cinema não somente tem sua maneira, sua forma própria, mas traz um material que era desconhecido antes dele: esse canto secreto do mundo que, por conta de sua magia, ele é capaz de revelar; o incomparável som que, manuseado com maestria, faz ressoar tudo o que toca.
- Éric Rohmer, na quarta parte de "O Celuloide e o Mármore", leitura recomendada para este mês.

O filme está disponível aqui. Qualquer problema, fale conosco.

Texto indicado para leitura:
A) A parte 4 de "O Celuloide e o Mármore", de Éric Rohmer, disponível na íntegra aqui.

Como de costume, nosso propósito no Clube do Filme é discutir obras e textos com um pouco mais de tempo que nos debates após as sessões do cineclube, logo, o filme não será exibido na data. Recomendamos que o filme já tenha sido visto e também a leitura dos textos, porém isso não é exigido para participação. Devido ao formato virtual, não poderemos exibir com qualidade trechos do filme e de outros trabalhos, mas acreditamos ser importante retomarmos as atividades possíveis durante a pandemia. O ingresso, como sempre, é gratuito.

Devido a limitações de tempo do Meet, voltamos com nossa sala do Jitsi.

Serviço:

Clube do Filme: "A Inglesa e o Duque" (2001), de Éric Rohmer
Dia 28/09 (quarta-feira)
Das 19h15 às 21h30
ENTRADA FRANCA

Coordenação e mediação: Giovanni Comodo
Realização: Coletivo Atalante

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

Cineclube do Atalante: Not Wanted

Neste sábado, o Cineclube do Atalante exibe um filme de Ida Lupino. Entrada franca, sempre!




“Not Wanted”, de Ida Lupino


(Not Wanted, EUA, 1949, drama, 91 min., livre)


Direção: Ida Lupino. Com Sally Forrest, Keefe Brasselle, Peter Lawford.


Uma jovem se sente atraída por um músico viajante enquanto se sente sufocada com a forma como seus pais a tratam. Ela deixa sua cidade natal para segui-lo, mas fica grávida e então é abandonada por ele e enfrenta uma decisão sobre o que fazer com seu bebê. Ela entrega a criança depois de dar à luz, mas se sente culpada a ponto de quase arrebatar uma criança de um carrinho.


Serviço:


CINECLUBE DO ATALANTE

“Mãe Solteira” (“Not Wanted”, 1949), de Ida Lupino

Sábado, 17/09

Às 16h

Na Cinemateca de Curitiba

(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174- São Francisco) (41) 3321-3552.


ENTRADA FRANCA



Realização: Coletivo Atalante

segunda-feira, 5 de setembro de 2022

O Pecado de Cluny Brown (1946)

por João Bénard da Costa


O título português desta obra, dá um pouco que pensar. Não se sabe se o tradutor fez prosa sem saber ou foi mais subtil que a maior parte dos críticos da época. Efectivamente, Cluny Brown nada faz no filme que possa ser classificado, de perto ou de longe, como um "pecado"; efectivamente, o filme de nada mais fala que do pecado, não do que ela faz, mas do que ela é. Se o título fosse mais exacto, não ficaria mal esta obra chamar-se não O Pecado de Cluny Brown mas O Pecado Cluny Brown. Porquê?

Nesta história, das mais insólitas que Lubitsch alguma vez contou, a protagonista surge-nos associada a duas preocupações maiores: encontrar o seu lugar, como o tio sempre lhe disse, e encontrar-se no lugar da profissão do tio, retirando o máximo prazer da acção de desentupir canalizações entupidas. Aparentemente, nada há nessa inquietação e nesse gosto de pecaminoso: realmente, introduz-se uma profunda inquietação de cada vez que Cluny Brown arregaça as mangas e avança, alegre e inocentemente, para as cozinhas ou para as casas de banho, a resolver esse pequeno problema doméstico. Perturbação que, no dia dos anos da futura sogra, é tão grande que lhe escangalha o casamento e lhe arruína a reputação. Para lá da ironia lubitschiana da situação (confronto entre a fachada puritana da família do farmacêutico ou dos lordes ingleses e a "naturalidade" de Jennifer Jones), tornando eventualmente chocante um episódio bem inocente, perfila-se uma segunda leitura (pontuada, na sequência inicial, pelo plano sobre o lava-loiças pejado de detritos) que é efetivamente chocante e nada tem de inocente. A imagem da porcaria contamina imediatamente Jennifer Jones, tornando-a uma mancha naquele mundo de fachada impecável. Ela não faz pecados, ela é um pecado: eis o que, numa das suas supremas elipses – elipse que constitui um filme – Lubitsch nos diz, nesta obra sobre o lugar do "porco" e do "limpo", da medida e da desmedida, da regra e da desregra.

Não é nada indiferente que esse lugar de pecado seja uma mulher com a aparência de Jennifer Jones (provavelmente, o efeito seria anulado, se o canalizador, como esperava o proprietário da primeira casa, fosse um homem). Não é nada indiferente que a acção se situe em Inglaterra, lugar por excelência da "limpeza", da "medida" e do "vitorianismo", naqueles assombrosos décors, onde o supremo tabu é, por definição, a referência a qualquer orgânica necessidade; não é nada indiferente que o tempo do filme seja o do imediato pré-guerra (1938), quando a sociedade inglesa estava nas vésperas de ser contaminada pelo mal nazi; não é nada indiferente que o único cúmplice de Cluny Brown, Adam Belinski, seja um estrangeiro, uma vítima do nazismo e comece por ser confundido com o esperado canalizador.

Logo nessa sequência inicial se estabelece, em torno do problema de lugar que tanto preocupa Jennifer Jones (enquanto está agachada debaixo do lava-loiças) a cumplicidade entre ela e Boyer. À transgressão de Jones, junta Boyer a transgressão verbal explicando-lhe a indiferença dos lugares e a permutabilidade entre as frases "nozes para os esquilos" ou "esquilos para as nozes" que, na sequência perto do fim, quando Jones vai ter com Boyer ao comboio, permite a este a plena revelação (associada ao tema da roupa de baixo).

Dessa inicial sequência de canalizadores, passamos para o solar e para Jones criada. A entrada desta em casa dos patrões é um dos momentos mais admiráveis do filme, e, provavelmente, poucas obras, mesmo em parâmetros ideológicos que Lubitsch não tinha, nos terão dito tanto sobre o estatuto e relações de classes. Porque Jones é confundida com uma "aventura" do velho coronel, personagem cujo estatuto implicava a tolerância para tais situações. Isto lhe permite sentar-se à mesa, tomar chá e, sobretudo – facto mais chocante – comer muito, o que torna cada vez mais surpreendente, aos olhos dos lordes, a sua associação ao coronel, mesmo como aventura dum dia. E quando finalmente Cluny Brown revela ao que vem, a imperceptível mudança (mas para ela decisiva) explica, finalmente, pela sua classe, o seu mistério, que é fundamentalmente o mistério do prazer. Depois, é a portentosa oposição ao mundo dos velhos mordomos (a relação entre a cozinheira e o mordomo é uma das mais geniais "maldades" de Lubitsch) e a cena em que Jones serve o jantar, tornando-se culpada da única gaffe indesculpável: ter explicado ao patrão que havia na peça de carne bocados melhores e bocados piores e que devia escolher os primeiros e não os segundos. Em torno da comida, prossegue a alusão que tinha começado em torno dos detritos: a história é a mesma. História a que vários contrastes – a casa do farmacêutico, o episódio amoroso entre Betty e o filho dos donos da casa, com os gritos e a impecável intervenção da sogra – vão conferindo maior peso elíptico, dando sempre o avesso de um direito jamais mostrado para, em termos convencionais, mostrar o direito de um avesso jamais exibido. E chegamos à segunda sequência de canalização, do dia do anúncio de casamento, em que o único cúmplice de Cluny é o miúdo e em que o presente de anos (a acção de dar prazer) se transforma na desgraça da protagonista. Para lá de tudo o que faz rir e do monumento de mise-en-scène que essa sequência é, Lubitsch retira as últimas dúvidas sobre a falta de lugar de Cluny Brown. Lugar que só encontrará no fim, na América, vestida de peles, entre novas associações não menos escabrosas: o romance policial e os ataques dos rouxinóis (nightingale em inglês, com a implícita alusão à vitória da noite sobre o dia, do mundo da criada e do exilado sobre o das ordenadas e limpas vidas que antes víramos).

A propósito de Heaven Can Wait (e recorde-se que esse filme e este são as duas últimas obras de Lubitsch) escrevi que o riso do autor se ia progressivamente gelando e recordei La Règle du Jeu de Renoir. Cluny Brown tem mais uma vez que ver com isso. O típico mundo lubitschiano, da plenitude de todos os instantes e da riqueza e variedade de histórias e personagens, atinge nesta obra magistral um despojamento deveras surpreendente. Já se disse que ele era "o lado oculto" de uma obra de que os outros filmes seriam o lado visível. Talvez seja melhor dizer que, ultrapassando o artifício da ilusão, Lubitsch se concentrou na ilusão do artifício: uma história em que quase se não passa nada, personagens quase sem história e a elipse a invadir todo o filme tornando-o progressivamente silencioso e fantomático. Por isso, talvez, este é um filme sem música, por isso, talvez este é o filme de Lubitsch em que a câmara menos se move e em que o vazio ocupa mais lugar. Cineasta tão ligado ao prazer e à carne, é sintomático que tenha terminado filmando o tabu desse prazer e dessa carne, ou o grande escândalo – o pecado – da sua jamais pacífica coexistência.

Texto em português de Portugal, escrito antes do Acordo Ortográfico em vigor e mantido conforme original. Retirado de http://www.cinemateca.pt/programacao.aspx?ciclo=1202.