sábado, 30 de junho de 2018

Cineclube do Atalante: programação de julho

07/07: Nuvens de verão, de Mikio Naruse  



(Iwashigumo: JAP, 1958– 128 min. Com: Chikage Awashima, Michiyo Aratama, Kumi Mizuno, Yôko Tsukasa. 14 anos.)
Yae é uma camponesa viúva dedicada à família e à lavoura que redescobre o amor com um jornalista da região, um homem casado. Yae tem de lidar com essa difícil situação, além do momento conturbado que sua família enfrenta.
21/07: Rosa la rose, garota de programa, de Paul Vecchiali

(Rosa la rose, fille publique: FRA, 1986– 84min. Com:  Marianne  Basler, Jean Sorel, Pierre Cosso, Stéphane Jobert. 18 anos)
Rosa la Rose é a mais bela prostituta de Les Halles. Todos os clientes a desejam e ela não nega nenhum deles. O seu cafetão é um homem compreensivo e generoso. Sobre a vida de Rosa há pouco a contar. Até que surge um jovem chamado Julien e ela se apaixona. Mas valerá a pena deixar sua vida por uma loucura de amor?

Serviço:
Sessões quinzenais aos sábados
16h
Na Cinemateca de Curitiba
(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174 - São Francisco)
(41) 3321 – 3552
ENTRADA FRANCA

Realização: Coletivo Atalante

domingo, 24 de junho de 2018

O classicismo de Brian De Palma


"Eu essencialmente não acredito em deixar o bem triunfar ou basicamente resolver as coisas, porque eu acho que nós vivemos numa era em que as coisas não se resolvem e eventos terríveis acontecem e você nunca se esquece deles."

por Matheus Cartaxo

Um travelling lateral, em câmera lenta, mostra muitas garotas, em sua maioria nuas, no vestiário feminino de um colégio. Na banda sonora os acordes também lentos da música de Pino Donaggio, ao mesmo tempo em que se contrapõem à agitação delas, coadunam-se à harmonia de que parecem desfrutar, bem como à despreocupação que uma das meninas deixa transparecer ao ser vista ensaboando-se de olhos fechados sob um chuveiro. De repente, num close de sua coxa, sangue começa a escorrer. Quando ela abre os olhos e repara no vermelho cobrindo seus dedos, espanta-se e corre, implorando por ajuda, para o meio das outras garotas, que já se encontram vestidas. Percebendo que ela não sabe o que se passa, as demais a cercam e, entre risadas, atiram-lhe absorventes enquanto ela é mostrada em pânico, em vários contraplanos, acuada contra a parede. Em poucos minutos o tom da cena mudou radicalmente: a harmonia do primeiro momento foi substituída pelo caos; a continuidade do travelling deu vez aos cortes abruptos na montagem; os acordes da música, aos gritos das meninas; a nudez generalizada, aos corpos cobertos, com exceção do daquela garota, que agora se envergonha do seu.

A sequência da primeira menstruação de Carrie no filme que leva o nome dessa personagem, além de ser uma das mais famosas da obra de Brian De Palma, é uma das mais representativas. A perda da inocência ali simbolizada é análoga ao que se sucede com o agente Ethan Hunt de Missão Impossível (Mission: Impossible, 1996), o policial Eliot Ness de Os Intocáveis (The Untouchables, 1987), ou os soldados Eriksson e Lawyer McCoy de Pecados de Guerra (Casualties of War, 1989) e Guerra Sem Cortes (Redacted, 2007), respectivamente. Todos eles, a princípio mais ou menos ajustados às circunstâncias em que vivem, veem-se subitamente lançados e implicados em mundos onde imperam a violência, as traições, as guerras, os complôs, como aquele onde Carrie passa a habitar a partir da sua queda do Paraíso, à qual se segue o seu “batismo” no Inferno – o mundo dos adultos. Primeiro, ela será uma vítima. Mais tarde, quando se vinga de uma grande humilhação que sofre no baile de formatura do colégio, ela se tornará a algoz dos seus algozes. Carrie, assim, se igualará a outras personagens de De Palma, como Jack Terry de Um Tiro na Noite (Blow Out, 1981), Rick Santoro de Olhos de Serpente (Snake Eyes, 1998) ou Tony Montana de Scarface (1983), que alimentam as engrenagens dos mundos corrompidos em que estão inseridos, agindo de modo a dar continuidade aos intermináveis ciclos que a todos aprisionam.

Em entrevista, De Palma afirma:

Eu essencialmente não acredito em deixar o bem triunfar ou basicamente resolver as coisas, porque eu acho que nós vivemos numa era em que as coisas não se resolvem e eventos terríveis acontecem e você nunca se esquece deles.

A percepção do cineasta está de acordo com o que notamos na maioria dos seus filmes. Ao término deles, há uma tendência à manutenção dos mundos nos quais eles transcorrem tal como esses foram apresentados no início das jornadas. Ao fim de Um Tiro na Noite, a sociedade permanece alheia à conspiração a qual o protagonista fracassa em revelar; em Olhos de Serpente o cassino onde se passa o filme, antro de crimes e disputas por poder, aparece sendo reconstruído mesmo após ter tido uma parte sua destruída; em Carrie (1976), embora a personagem morra, ela volta atormentando os sonhos dos sobreviventes do massacre que provocou na escola. A estrutura circular das narrativas de De Palma faz parecer que nos seus filmes nenhuma transformação acontece, nada de novo pode surgir. Dessa forma, o Paraíso não passa de uma miragem, um papel de parede, como é dado a ver numa cena de Scarface, porque aqueles que lá se encontram, como Tony Montana, precisaram abandonar toda esperança.

A coerência formal e temática que De Palma cultiva desde os seus primeiros trabalhos na indústria de Hollywood torna necessário o esforço de compreender as aparentes exceções às regras. Em 1993, o diretor de Scarface e Os Intocáveis realizou O Pagamento Final (Carlito’s Way, 1993), filme no qual ele retorna ao mundo do crime organizado para contar a história de um gângster da “velha guarda” que, todavia, pretende deixar para trás as ruas corrompidas de uma Nova York dos anos 1970 a fim de reiniciar a vida nas Bahamas, ao lado da mulher que ama. No entanto, se o seu desejo é realmente alcançar esse Paraíso, Carlito Brigante, recém-saído da prisão – um símbolo do Inferno –, precisará provar que é merecedor daquilo, empenhando-se em conquistar o seu lugar lá. Em outras palavras: ele precisará mudar a si mesmo e resistir às tentações que lhe são feitas pelo mundo ao qual ele retorna, o qual parece forçá-lo a continuar sendo o mesmo do passado. O sucesso dessa jornada dependerá, finalmente, da maneira como Carlito agirá em função de dois polos que exercem atração sobre ele, um que tenta arrastá-lo para baixo e outro para o alto, os quais são representados, respectivamente, pelas figuras do seu advogado e amigo David Kleinfeld, e de Gail, sua namorada.

Kleinfeld é um típico personagem depalmiano: violento, corrupto, viciado, egocêntrico, megalomaníaco, explosivo, capaz de arrastar todos à sua volta consigo para o caos. Gail, em contrapartida, é a ordem que Carlito almeja em sua vida. Nesse sentido, é representativa a cena em que, a fim de contemplá-la à distância, Carlito sobe ao topo de um prédio localizado no lado oposto daquele onde Gail participa de uma aula de balé. Para proteger-se de uma forte chuva, ele usa uma tampa de lixo, encaminhando-se com tal objeto sobre a cabeça para a beirada do prédio. No plano em que o vemos, é marcante a escuridão da noite, a chuva forte; no contraplano em que Gail é vista, existe a luminosidade da sala de aula, o ambiente controlado, protegido. As bailarinas em meio às quais ela se encontra dão piruetas e passam seus braços em arcos sobre as próprias cabeças, formando no ar simultaneamente auréolas e asas de anjos de um coro celestial. Em oposição, Carlito permanece se cobrindo com a tampa de lixo, espécie de auréola degradada de um anjo caído, saudoso ao enxergar diante de si, na distância entre os dois prédios, o abismo que o separa do Paraíso a ser reconquistado.

O ponto de inflexão na trajetória do protagonista de O Pagamento Final é a descoberta de que Gail está grávida de um filho seu. Como sugere a mise en scène da cena da aula de balé, Carlito é como um cão vira-lata, em trânsito por diferentes lugares ao longo do filme, mas nunca em algum que de fato lhe pertença, como a sua casa, embora seja esse o seu desejo. A descoberta de que será pai acelera a necessidade de ele possuir um lar – como, afinal, aquela sala de aula, aquecida, acolhedora e segura. Além disso, a chegada desse novo indivíduo permite a Carlito sair de si mesmo, abrir-se à realidade do outro, afastando-se de vez da galeria de personagens autocentrados e ensimesmados do cineasta, na qual se encontram o seu antagonista David Kleinfeld, além de Rick Santoro, Jack Terry ou Tony Montana. Diferente de outros filmes de De Palma, em O Pagamento Finalexiste, pois, possibilidade de haver transformações. Isso se torna evidente quando, na última cena, à beira da morte, Carlito enxerga diante de si um anúncio publicitário parecido com o papel de parede de Scarface: vemos uma paisagem de praia acrescida de uma banda de percussionistas e uma mulher que dança. À medida que um movimento de zoom faz essa imagem preencher toda a tela, porém, ela abandona a fixidez e adquire movimento. Aquela mulher, devido aos seus movimentos de dança, aparenta-se a Gail, a quem se junta, em seguida, uma criança a qual ela segura nos braços – o filho do casal. Embora o plano de viajar para as Bahamas tenha fracassado, Carlito conseguiu re-hierarquizar seus princípios de modo a alterar os rumos da sua história, injetando nela o Novo, simbolizado pelo filho que ele verá crescer de longe. O anjo caído, enfim, perdeu o mundo, mas ganhou sua alma; o maneirismo pelo qual De Palma é reconhecido passa por um processo análogo, ascendendo a um classicismo que antes parecia fora do seu horizonte. Para além do seu tema, portanto, a conclusão de O Pagamento Final destoa do habitual na obra de De Palma pelo motivo de que ali o cineasta, afeito a rebuscadas operações formais com as imagens (cf. Trágica Obsessão, Vestida Para Matar, Dublê de Corpo), opta por colocar em cena de maneira frontal, qual o canto rasgado de Joe Cocker que ouvimos nestes créditos finais, o drama da personagem. Basta-lhe um plano fixo de uma paisagem bidimensional, composta de formas e cores simples, quase abstratas, as quais expressam, talvez pela primeira vez na sua obra, uma pureza ainda não aviltada.

Em 2000, com Missão: Marte (Mission to Mars), De Palma levou ao paroxismo os temas e a frontalidade que marcam a conclusão de O Pagamento Final. Como consequência, o filme gerou estranheza na crítica que, à altura do lançamento, buscou identificar o pouco que ele tinha em comum com outros trabalhos de De Palma ou, simplesmente, o considerou como um ponto fora da curva na sua filmografia, o seu projeto mais impessoal, o qual, por isso, não seria digno de atenção. Em Missão: Marte, um grupo de astronautas vai a outro planeta a fim de resgatar os possíveis sobreviventes de uma equipe envolvida em um acidente. Como o título sugere, a história se passa fora do tradicional mundo corrompido do cineasta, repleto de crimes, conspirações e assassinatos. A esperança, ausente ou rara nos seus filmes, é trazida agora para o centro da história, guiando as personagens na busca pelos amigos desaparecidos. Da mesma forma, se o comum em De Palma sempre foi personagens fechadas em si mesmas, tudo em Missão: Marte é abertura, partilha e, no limite, sacrifício, com os astronautas sendo capazes de dar a própria vida pela dos seus pares e a continuidade da missão.

A crítica não percebeu que, justamente por se localizar nas antípodas de tudo o que De Palma fizera até o momento, Missão: Marte complementava o sentido da sua obra, servindo como a peça faltante no quebra-cabeça que ao longo de décadas o cineasta vinha construindo. Numa filmografia marcada pela perda da inocência, como é representado na cena do vestiário feminino de CarrieMissão: Marte é uma exceção principalmente por incorporar a presença constante da infância. A chegada do filho de Carlito Brigante em O Pagamento Final permitiu ao ex-gânsgter abrir-se a sentimentos dos quais ele permanecera distante, fazendo com que, nos últimos segundos de vida, ele atravessasse um portal que o levou a um cenário idílico, onde tudo parece retornar a um estágio inicial de pureza. Em Missão: Marte, contudo, os astronautas estão, desde o início, imersos nessa realidade que Carlito, com muito empenho, conseguiu alcançar. A fim de simbolizar isso, De Palma, na sequência de abertura do filme, que se passa na festa de despedida daqueles que logo viajarão para o planeta vermelho, povoa a tela com crianças brincando. Em seguida três dos astronautas conversam, recordando o prazer que tinham em ler livros de ficção-científica. Um deles, inclusive, mostra o colar que carrega desde criança, cujo pingente é uma miniatura da nave do herói Flash Gordon. Esses astronautas parecem em constante contato com os sonhos que possuíam no passado, e o filme, por consequência, se tornará a arena onde esses se realizam.

No clímax de Missão: Marte os astronautas travam contato com um ser alienígena que, como um deles percebe, estende um convite para que todos se unam a fim de se aventurar pelo espaço na exploração dos segredos do universo. Surpreendendo os demais, Jim, o mais arguto do grupo afirma que seguirá nessa viagem. Ele recebe então de presente o colar com a nave de Flash Gordon que pertencia ao seu amigo e reconhece, aninhadas nela, as suas próprias motivações, as quais o levam, naquele momento, a embarcar numa jornada rumo a tudo o que desconhece. Neste momento, o filme chega ao seu ápice: ao embarcar na nave dos marcianos, ele entra numa cápsula onde um líquido o cobre dos pés à cabeça, porém sem sufocá-lo. A temática da infância que se desenvolvia desde o início atinge o ponto máximo nessa analogia entre o que se passa com Jim e um bebê no ventre materno, para quem o mundo ainda é um magma de potências. Como em O Pagamento Final, em que De Palma mostrava em planos-contraplanos os olhos de Carlito e a sua visão do Paraíso, aqui vemos o rosto de Jim e o que ele enxerga: não uma única imagem, mas flashes muito breves de toda a sua vida, dos seus amigos e da sua esposa, dos vivos e dos mortos, todos reunidos num fluxo de imagens difícil de ser assimilado porque disparado à queima-roupa. As imagens surgem na tela no tempo necessário apenas para marcá-la com alguns sentimentos, como aquele provocado ao vermos um casal posando para uma foto na lua de mel ou uma criança que sorri ao ganhar um telescópio no dia de Natal.

A regra em De Palma era a repetição, a condenação ao Mesmo. Em Missão: Marte, tudo é mudança e cada acontecimento, seja um reencontro, uma despedida ou uma morte trágica, desdobram-se em novas circunstâncias às quais é preciso se adaptar a fim de desbravá-las, até o momento em que novas transformações aconteçam. Os astronautas do filme aceitam o que lhes é dado a viver, sem cair nas tentações de controlar os demais à sua volta ou de ter o mundo aos seus pés. Se a realidade não deixa de fasciná-los, oferecendo infinitas possibilidades as quais os impelem a seguir adiante, é porque, ao invés de agirem com soberba, subindo nos próprios ombros, eles preferiram retornar à infância, apequenando-se para que tudo em volta pareça maior.

M
atheus Cartaxo é editor e redator da Foco – Revista de Cinema e mestre em comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco.

Texto originalmente publicado em https://cultura.estadao.com.br/blogs/estado-da-arte/foco-o-classicismo-de-brian-de-palma/

quinta-feira, 21 de junho de 2018

Cineclube do Atalante: "Paixão" de Brian De Palma


Isabelle é uma jovem publicitária que admira sua chefe Christine, uma mulher tão encantadora quanto ambiciosa. No começo elas se dão muito bem, até que Isabelle começa a se transformar em uma ameaça. Christine tentará seduzi-la para acabar com ela.

Serviço:
Sábado, 23 de junho.
16h
Na Cinemateca de Curitiba
(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174 - São Francisco)
(41) 3321 – 3552
ENTRADA FRANCA

Realização: Coletivo Atalante

domingo, 17 de junho de 2018

Curso Nouvelle Vague



Apresentação:
Curso Nouvelle Vague é uma introdução ao movimento que na passagem dos anos 1950 para os 1960, impôs uma renovação violenta nos quadros do cinema francês e, a partir dele, do cinema mundial. Renovação técnica, e filosófica, a Nouvelle Vague (nova onda) propõe num contexto de rápidas mudanças nos modos e costumes uma nova forma de ver, pensar e fazer filmes.

Tomando como ponto de irradiação o período 58-62 e os longas de estreia dos "jovens turcos" da crítica francesa ("Nas garras do vício" de Claude Chabrol, "Os incompreendidos" de François Truffaut, "Acossado" de Jean-Luc Godard, "Paris nos pertence" de Jacques Rivette e "O signo do leão" de Eric Rohmer), o curso expande a sua exploração por textos críticos e filmes anteriores, bem como analisa algumas consequências nos períodos posteriores. A costura de filmes e textos parte do princípio, muito defendido pelo próprio grupo, de que existe uma diferença de de grau, não de natureza entre o trabalho do crítico e o trabalho do cineasta.

Esta colcha de retalhos pretende portanto, desenhar um quadro justo do que foi este cinema e de que formas podemos nos aproximar dele.

Por exemplo: no dia dedicado à "Os incompreendidos", 1 - começamos pela apreciação de uma cena do filme arquetípico da "Tradição de qualidade", "Sinfonia pastoral" (Jean Delannoy, 1946), 2 - passamos pela análise de cinco pontos do manifesto anti-"Tradição de Qualidade" de Truffaut "Uma certa tendência do cinema francês" (Cahiers du cinéma, 1954), 3 - em seguida veremos a cena da máquina de escrever de "Os incompreendidos", muito bem observada na crítica de Godard, "Truffaut representará a França em Cannes com 'Les 400 coups'" (Arts, 1959), 4 - lemos esta crítica e 5 - depois voltamos até 1953 e apreciaremos o plano revolucionário (citado em "Os incompreendidos") de Harriet Andersson encarando a câmera de Ingmar Bergman em "Monika e o desejo" e 6 - encerramos o dia analisando cinco pontos do texto de Bergmanorama (Cahiers du cinéma, 1958), de Godard sobre o cinema de Bergman.

Esta estrutura ziguezagueante conformará o trabalho de cada encontro do curso, mudando, evidentemente, seus objetos de análise.

Programa (18 pontos a percorrer):
1 - A sinfonia pastoral (Jean Delannoy, 1946);
2 - "Uma certa tendência do cinema francês" (François Truffaut, 1954);
3 - Os incompreendidos (François Truffaut, 1959);
4 - "Truffaut representará a França em Cannes com 'Les 400 coups' (Jean-Luc Godard, 1959);
5 - Monika e o desejo (Ingmar Bergman, 1953);
6 - "Bergmanorama" (Jean-Luc Godard, 1958);
7 - "O nascimento de uma nova vanguarda: a 'caméra-stylo'" (Alexandre Astruc, 1948);
8 - Anjo do mal (Samuel Fuller, 1953);
9 - "Nos passos de Marlowe" (Luc Moullet, 1959);
10 - Acossado (Jean-Luc Godard, 1960);
11 - "O corpo" (Jean Douchet, 1998);
12 - O Bandido da Luz Vermelha (Rogerio Sganzerla, 1968);
13 - "Éric Rohmer: só o belo é verdadeiro" (Luiz Carlos Oliveira Jr., 2010);
14 - O signo do leão (Eric Rohmer, 1962);
15 - "O antigo e o novo" (entrevista com Eric Rohmer, 1965);
16 - Viagem à Itália (Roberto Rossellini, 1954);
17 - "Carta sobre Rossellini" (Jacques Rivette, 1955);
18 - Jacques Rivette: o vigilante (Claire Denis e Serge Daney, 1990).

“E nasce pela simples razão de que essa geração educada pela arte, pela literatura e pelo cinema e formada na Cinemateca Francesa de Henri Langlois (e, como salienta Jean Douchet, uma geração cujos principais membros se chamavam Godard, Truffaut ou Rivette), não se vai limitar nem à denúncia nem à mera, e tão ‘juvenil’, contestação. Essa geração tinha a plena consciência de que aquilo que atacava era um sistema de valores, e que para ser bem sucedida não podia deixar de propor um novo sistema de valores que substituísse o anterior. Foi esse trabalho de substituição que foi desenvolvido nos Cahiers durante a década de 50, um trabalho que teve na ‘Política dos Autores’ o seu resultado mais visível, mas não o único – até porque a ‘Política dos Autores’, se foi uma ideologia, foi também, e se calhar principalmente, um método, o fio de Ariane que permitiu que se regressasse do mergulho na história do cinema com uma reorganização dessa história, ou seja, com esse tal ‘outro’ sistema de valores. À paixão pelo cinema (coisa relativamente comum) juntava-se algo de bastante mais raro: um profundo conhecimento da sua história e teoria que, aliado a uma perfeita intuição de que o cinema é uma coisa e um filme é outra (ou seja, que existe uma natureza cinematográfica que se manifesta através dos filmes), teve como resultado o nascimento de toda uma nova cultura do olhar, para a qual um filme já não é divisível (ou redutível) em parcelas, construindo antes um todo orgânico erguido em torno de um coração, ou, se calhar melhor, de um cérebro: a mise-en-scène. Foi esta concepção ‘orgânica’ do cinema que, aplicada ao conjunto do trabalho de um cineasta, permitiu encontrar obras e autores, e foi ainda ela que suspendeu a forçosa desordem temporal em que a história do cinema foi apercebida pela geração da Nouvelle Vague, precisamente por permitir perceber que, no cinema, as continuidades e equivalências não são, necessariamente, de ordem cronológica ou geográfica.”

- Luis Miguel Oliveira, fragmento da nota de abertura da Mostra Nouvelle Vague na Cinemateca Portuguesa.

Curso Nouvelle Vague: 
Com Miguel Haoni (Coletivo Atalante)
De 2 a 6 de julho (segunda a sexta)
das 18h30 às 21h30
na Casa do Contador de Histórias
(Rua Trajano Reis, 325. São Francisco - Curitiba)

Inscrições pelo email: coletivoatalante@gmail.com
Investimento: R$150,00**
VAGAS LIMITADAS

Realização: Casa do Contador de Histórias e Coletivo Atalante

**O sorteio do desconto de 50% na inscrição vale até hoje (01/07) às 23h. Para participar curta e compartilhe a imagem no link:  https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1376685485809840&set=a.131239600354441.36425.100004052061300&type=3&theater

domingo, 10 de junho de 2018

JACQUES RIVETTE, QUESTÃO DE VIDA E MORTE



A natureza é passado. Hoje, tudo está destruído
Pascale Ogier em A Ponte do Norte

Tudo é possível nos filmes de Jacques Rivette. Para além da sua rigorosa mise en scène, das recorrentes indicações de tempo e lugar (Paris, aurora, noite, lua cheia, fim de inverno, primavera...) ou do uso preciso de números e palavras a conjurar uma natureza (via de regra) negligenciada das coisas e dos sentimentos, preserva-se, quase sempre, a potência narrativa das hipóteses, a sensação de que as coisas poderiam ter outro rumo, começar de outra maneira, que “deveriam prosseguir”. 

Naturalmente, Rivette não acredita na mise en scène como um sistema fechado, totalizante ou previamente determinado. Sua obra, em grande medida, é um compartilhamento minucioso do processo artístico, acatando e incorporando as contingências do percurso, o risco. Nos seus filmes, somos cúmplices nesse desnudamento austero (às vezes doloroso) dos meandros da criação, presenciamos e, sobretudo, ouvimos os atritos do artista com os meios (as ferramentas), a reverberação no mundo, da luta íntima que antecede e molda o ato de criar. 

E, neste sentido, o campo sonoro ocupa um espaço privilegiado na poética rivettiana. Há algo de violento e quase sobrenatural no som do vento em obras como Noroeste, Hurlevent e Merry-go-Round ou no ruído que emana da escrita quando o religioso guia o desenho do nome (a assinatura) de Jeanne D’Arc (em A Donzela – As batalhas), conferindo-lhe neste gesto sua própria existência histórica (ela usará como inscrição apenas o x para renegar seus atos na curva final de sua trajetória). E, ainda, a cortante melodia produzida pelo estalar do assoalho dos inúmeros palcos teatrais que abrigam suas tramas, evidenciando a presença física dos atores (em algumas situações mais forte até que a imagem deles), além de vários outros exemplos que culminam nos inesquecíveis sons dos rascunhos em A bela intrigante, onde o único indício que teremos do que foi, de fato, a pintura criada ao longo do filme, essa tela emparedada por escrúpulo ao nosso olhar (e não apenas para “proteger” a modelo ali exposta). 

Sim, o cinema de Rivette é casto. Se não sabemos o que vai acontecer no plano seguinte, o destino de tal personagem e aspectos de sua personalidade, não é tanto pelo suspense ou mistério que isso pode gerar, é mais por pudor em devassar, aclarar por demasiado o que vemos, as pessoas e cidades que conhecemos através de sua filmografia. E nós mesmos. Para não constranger nossa maneira mais mundana de ver a vida, nossa sensibilidade, capacidade de concentração e apreensão. Acontece tanta coisa nos seus filmes, são tantos os desdobramentos de sua obra que a (longa) duração da maioria de suas realizações é relativizada pelo intenso trabalho mental que implica habitá-las pelo tempo da projeção. Quer dizer: podemos ir para a sala de exibição para não fazer nada (e qualquer curta-metragem vai nos parecer interminável) ou operar com os filmes, vivê-los, pensarmos com eles e quatro, cinco horas em companhia de Rivette se torna algo muito maior que uma simples evasão. 

Dá a impressão que nos tornamos mais aptos, capazes de aprender, quer uma dança (Paris no Verão), uma música e até outros idiomas. A começar pela forma como as palavras são pronunciadas. O som delas é tão detalhado que por mais que não dominemos o idioma utilizado, temos a impressão de este nos ser familiar, acessível. Há muitos movimentos (e nos sentimos seguros o suficiente para completar cada um deles) e tantas línguas em  Rivette: francês, inglês, espanhol, italiano e até português – entrecortadas, coexistentes, às vezes, numa mesma frase. O bando das quatro, por exemplo, nos permite experimentar, do outro lado do espelho, esse poder encantatório da pronúncia no universo rivettiano:  a atriz lusitana Inês de Medeiros evoca, em bom português, uma espécie de canção de ninar (“ A noite, a lua, as árvores, o vento. A noite é menina e não quer bailar”) para acalmar os fantasmas do casarão onde mora. A opção em manter a língua materna da intérprete já denota a crença de Rivette nessa comunicação ancestral, além do mais é difícil imaginar que alguém que desconheça o português não se sinta próximo dele ao fim da sequência. 

Por tudo isso, o cinema de Jacques Rivette nos propõe questões (hipóteses) de vida e morte. O “jogo redescoberto” em A Ponte do Norte  traz um  mapa em forma de tabuleiro,  no qual a “casa”  que representa o túmulo também pode reconduzir o jogador ao ponto de partida e não apenas ao fim. É um jogo do passado, “hoje um túmulo, é somente um túmulo”, constata  Bulle Ogier. Cabe a nós, diante das possibilidades oferecidas, percorremos cada casa dessa topografia rivettiana, reconfigurando a partir das inúmeras hipóteses que seus filmes preservam, a nossa posição diante do cinema. Estamos também no palco, como na peça encenada nos cômodos da mansão em O Amor por terra, em que o espectador, o seu olhar, faz parte do plano, da mise-en-scène. Ou em Celine e Julie vão de Barco, nas visitas que as protagonistas fazem a uma velha casa habitada por fantasmas e,  depois de se familiarizarem com aqueles personagens, reorientam a própria narrativa encenada: “ não é mais melodrama”, avisa Juliet Berto –  e como não pensar naquele casarão ainda como a Cinemateca Francesa e Rivette como aquele que entra nessa imensa morada do cinema para mover as peças e as histórias conforme sua poética? 

Adolfo Gomes
Dezembro de 2013


Texto extraído de http://www.contracampo.com.br/100/pgrivetteadolfo.htm

quinta-feira, 7 de junho de 2018

Cineclube do Atalante: "Jacques Rivette, o vigilante" de Claire Denis e Serge Daney

Integrante da série "Cinéma, de notre temps", este documentário de Claire Denis retrata o diretor e crítico de cinema Jacques Rivette, de quem ela foi assistente, geralmente avesso à mídia, em conversas com outro crítico e cinéfilo, Serge Daney. Nas duas partes do filme (O Dia / A Noite), os dois encontram-se às voltas com o início da "turma dos quatro" – Godard, Rivette, Rohmer e Truffaut –, com a Cahiers du Cinéma, André Bazin e – em palavras e imagens – com cinco trabalhos essenciais da filmografia de Rivette: "Paris nous Appartient", "L'Amour Fou", "Out 1", "Duelle" e "Le Pont du Nord".


Serviço:
Sábado, 09 de junho.
16h
Na Cinemateca de Curitiba
(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174 - São Francisco)
(41) 3321 – 3552
ENTRADA FRANCA