sábado, 30 de novembro de 2019

Do que falamos quando falamos de cinema

por Giovanni Comodo


Temos a sensação de uma arte que encontrou seu perfeito equilíbrio, sua forma de expressão ideal e, reciprocamente, admiramos neles os temas dramáticos e morais que o cinema, embora não os tenha totalmente criado, ao menos elevou a uma grandeza, a uma eficácia artística que, de outro modo, nunca teriam alcançado. Em suma, todas as características da plenitude de uma arte 'clássica'.
André Bazin (O que é o cinema?)

Nas últimas cinco sessões, nosso cineclube se dedicou à chamada “Hollywood clássica” – os filmes dos estúdios norte-americanos das décadas de 30, 40 e 50. Se a questão geográfica do rótulo é compreensível, resta a questão do clássico – especialmente por termos vistos juntos filmes que são, na realidade, surpreendentes e transgressores ao estilo e convenções da época, que foram responsáveis por alterar e, finalmente, a modelar e tornar o padrão do tal “clássico”. E o que seria isso? William Wyler responde em “Da terra nascem os homens”.

Não se trata de ineditismo, os westerns contam sempre as mesmas histórias – aqui é a de um forasteiro que chega a uma cidade com clãs rivais em guerra e tenta dar fim a isto de sua própria maneira (Akira Kurosawa e Sergio Leone que o digam). Mas de como contar esta história. Wyler, que começara a carreira no cinema mudo de alta rodagem (assinou quase 20 produções em 1927), costumava dizer que, de tanto fazer westerns, ficava acordado à noite tentando pensar em novas maneiras de mostrar como montar em um cavalo. Dos mais de 40 filmes que fez deste gênero, “Da terra nascem os homens” é o seu último e uma espécie de síntese de todo o seu trabalho.

Em suas quase três horas, Wyler não apenas faz um grande filme, mas também funda uma nação (é um western, afinal). E o que é necessário para isso? O próprio filme diz: “terra, 200 cabeças de gado, 100 milhas de cerca e empregados” – os dois últimos requisitos são especialmente reveladores da alma americana. Assim como aqui não se faz um país sem cercas, Wyler não nega nem a violência nem o seu fascínio exercidos desde a sua fundação, como nas cenas em que se contam histórias deste passado nas belas varandas e entradas das grandes casas do filme. Estas propriedades luxuosas não existiriam sem sangue e algumas trapaças.

Há outro requisito também: homens e mulheres, e Wyler nos exibe alguns de seus melhores exemplares em Gregory Peck (o forasteiro), Jean Simmons (a professora), Charlton Heston (o capataz) e Carroll Baker (a herdeira rica). Belos, jovens e de vozes musicais, torcemos para os dois primeiros, luminosos, ficarem juntos desde o princípio – e também pelos dois últimos furiosos afinal se juntarem, ainda que isto já seja outro filme (ou outro livro: “O Morro dos ventos uivantes”, o qual o próprio Wyler já adaptara anos antes).

E é acompanhando estes corpos nos espaços abertos, em que até os interiores são imensos (it’s a big country), que Wyler exibe o fino de sua arte. Através da profundidade de campo e a sua exploração constante que somos situados e imersos neste universo, que ganha mais e mais presença física em nossas mentes, tornando a duração deste filme um documento real que nós habitamos por algumas horas, compartilhando seus dramas e sentimentos. Porque de nada adiantaria a maneira como Wyler cria linhas verticais o tempo todo no Scope (o formato super horizontal do filme), expandindo o nosso olhar e deixando mais “ar” entrar nos enquadramentos, ou como usa a arquitetura para emoldurar seus personagens, se tal não fosse para sublinhar e nos exibir sentimentos – respectivamente, a imensidão da paisagem natural e o isolamento de Peck na grande residência, por exemplo. Ou a enorme distância com que Wyler filma a luta entre Peck e Heston, tanto preservando a privacidade do confronto entre aqueles dois homens como revelando a pequenez daquela disputa – escolha corajosa do diretor, subvertendo as expectativas da plateia e mesmo as convenções do western.

Através das técnicas, tudo passa a ser crível e palpável neste cinema. Mas há também aquilo que foge a elas e que também é determinante para nossa experiência, como a pura energia dos animais vistos no filme – das manobras com cavalos no início ao bagre que salta no rio no momento determinante de uma conversa – e o calor da presença dos atores na tela. O que Peck, Heston, Burl Ives e tantos outros trazem não pode ser substituído ou sequer explicado. 


William Wyler é o responsável por vermos tudo isso diante de nossos olhos, são frutos de suas decisões criativas – até mesmo manter no filme o take específico com o bagre saltador. E aqui, como dizia Bazin no topo deste texto ao discorrer sobre o que seria o clássico na sétima arte, em “Da terra nascem os homens” tudo parece se alinhar em uma potência de excelência artística que atinge uma eficácia plena dos sentimentos.

Quais sentimentos e a que servem? Falar de amor, justiça, dignidade e trabalho às pessoas e entretê-las por algumas horas e além das salas de exibição. Nunca houve nada como a Hollywood Clássica. É o sinônimo de cinema. É para onde podemos voltar sempre, fortalecidos e transformados.

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Cineclube do Atalante: Da Terra Nascem os Homens

Neste sábado, o Cineclube do Atalante exibe "Da Terra Nascem os Homens", de William Wyler. Entrada franca, sempre!



Instagram: @cineatalante

Da terra nascem os homens
 
(The Big Country, EUA, 1958, 166 min, Livre, com Gregory Peck, Jean Simmons, Charlton Heston)
Um capitão da marinha chega ao Texas no Velho Oeste para se casar e se vê envolvido em uma disputa entre famílias da região por uma valiosa propriedade por onde passa um rio. Seus valores urbanos são colocados em xeque pela população local enquanto busca por amor e justiça.

Dirigido por William Wyler.

Serviço:
Cineclube do Atalante: Da terra nascem os homens
Sábado, 30 de novembro
Às 16h
Na Cinemateca de Curitiba
(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174- São Francisco)
(41) 3321-3552
ENTRADA FRANCA

Realização: Coletivo Atalante, Fundação Cultural de Curitiba e Prefeitura de Curitiba.

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Cineclube do Atalante: Janela Indiscreta


Neste sábado o Cineclube do Atalante exibe "Janela Indiscreta", de Alfred Hitchcock. Entrada franca, sempre!


Instagram: @cineatalante

Janela Indiscreta
(Rear Window, EUA, 1954, 112 min, com Grace Kelly, James Stewart, Thelma Ritter, Raymond Burr, Wendel Corey).
Em Greenwich Village, Nova York, L.B. Jeffries, um fotógrafo profissional, está confinado em seu apartamento por ter quebrado a perna enquanto trabalhava. Como não tem muitas opções de lazer, vasculha a vida dos seus vizinhos com um binóculo, quando vê alguns acontecimentos que o fazem suspeitar que um assassinato foi cometido.

Serviço:
Cineclube do Atalante: Janela Indiscreta
Sábado, 16 de novembro
Às 16h
Na Cinemateca de Curitiba
(Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 1174- São Francisco)
(41) 3321-3552

ENTRADA FRANCA


Realização: Coletivo Atalante, Fundação Cultural de Curitiba e Prefeitura de Curitiba.

Projeto realizado com o apoio do Programa de Apoio e Incentivo à Cultura | Fundação Cultural de Curitiba e da Prefeitura Municipal de Curitiba.