segunda-feira, 31 de março de 2014

Sem sol


(fragmento do texto “Toda a Tristeza do Mundo”)
Se Van Gogh havia sido o filme mais ensolarado de Pialat, seu último longa-metragem, Le Garçu (1995), sefecharia em nuvens novamente: o filme se transporta de um clima de férias de verão ao som de reggae (com a vida conjugal já em crise) para um cenário cinza e invernal (com o casal já vivendo separado). Mais singelo e menos amargurado que as obras anteriores do diretor, Le Garçu possui, entretanto, uma tristeza de fundo que é quase tão desoladora quanto a de seus filmes dos anos 1970.
Em Nós Não Envelheceremos Juntos, o relacionamento acaba depois de seis anos e não sobra nada de palpável, somente uma lembrança, uma imagem fugidia, como aquela imagem já refratada pela luz da memória que encerra o filme mostrando Marlène Jobert na praia – imagem mental, flashback, sonho? Em Le Garçu, o casal teve um filho antes de se separar. Um vínculo efetivo permaneceu daquela história a dois já terminada, um vínculo que, para dizer o mínimo, não é mais da ordem fantasmática da imagem memorial.
O plano da criança se desgarrando de seus colegas durante uma excursão escolar e caminhando sozinha num parque, com folhas secas sendo arrastadas pelo vento ao seu redor, é a imagem mais forte de Le Garçu: Pialat faz todo e qualquer espectador se enxergar nesse filho do inverno condenado a descobrir o mundo sozinho, não importa o quão ausentes ou presentes serão seus pais. Após a visita ao hospital e a cena da morte do pai do personagem de Gérard Depardieu, compreendemos que Le Garçu condensa em uma só obra a trilogia da vida que seus três primeiros longas compõem (Infância Nua, Nós Não Envelheceremos Juntos e La Gueule Ouverte: infância e solidão, vida adulta e separação, velhice e morte).
Entre Le Garçu e a data da morte de Pialat, decorreriam oito anos de reclusão e silêncio. Os Cahiers du Cinémaforam atrás dele em 2000 e fizeram uma longa entrevista. Ideias não faltavam, mas a saúde já debilitada o impedia de trabalhar. Ele viria a falecer no dia 11 de janeiro de 2003, aos 77 anos.

Luiz Carlos Oliveira Jr.
(texto na íntegra: http://www.revistainterludio.com.br/?p=3463)

Cineclube Sesi apresenta: James Gray

Pogramação
03/04 - "Fuga para Odessa"
10/04 - "Caminho Sem Volta"
17/04 - "Os Donos da Noite"
24/04 - "Amantes"

Serviço:
Toda quinta 
às 19h30
na Sala Multiartes do Centro Cultural do Sistema Fiep
(Av. Cândido de Abreu, 200, Centro Cívico)
ENTRADA FRANCA

Realização: Sesi 
Produção: Atalante

domingo, 30 de março de 2014

Poiesis: A Paixão Segundo G. H., com Lúcia Cherem

A Paixão Segundo G. H., 05/04, com Lúcia Cherem*, no Décimo Primeiro Andar da Reitoria (UFPR), Prédio Dom Pedro I (Das 14 às 18 horas).

A obra apresentada será "A Paixão Segundo G.H.", possivelmente o romance mais celebrado de Clarice Lispector. Neste livro, Clarice nos apresenta - através de seus intrincamentos linguísticos - o processo epifânico de G.H. ao defrontar-se com o desconhecimento que a constitui. Todo o percurso de G.H. rumo a si mesma se dá em um lugar supostamente conhecido por ela: um cômodo de seu apartamento. E aí entra o fator essencial do livro: o que se achava conhecido, torna-se o desconhecido e a necessidade de explorá-lo e de transformar essa exploração em narrativa converte o banal da limpeza em um quarto num profundo movimento de encontro com o próprio "ser". Assim, o que se dá no nível dos acontecimentos é apenas o fator desencadeador de uma reflexão profunda sobre o que ou quem se é. E as palavras se estabelecem de maneira paradoxal, pois são ao mesmo tempo a impossibilidade de se traduzir a experiência e também o único meio de fazê-lo. A famosa passagem do livro na qual G.H. come uma barata talvez seja o imponderável na condição humana: o encontro com o Real, sem possibilidade de tradução em palavras.

Texto de Diamila Medeiros.

O Poiesis é um evento de extensão da UFPR, organizado pelo Coletivo Atalante e sob a coordenação do professor Benito Rodrigues. Consiste em ciclos de palestras sobre grandes clássicos da literatura mundial, sendo tais palestras conduzidas por professores da UFPR, especialistas em tais obras. Por outro lado, este evento também faz parte de um esforço da universidade em abrir-se para a comunidade não acadêmica, fazendo circular um saber geralmente restrito ao público da academia. Todas as palestras ocorrem sábado à tarde, da 14 às 18 horas na Reitoria.
Estamos no segundo ciclo, O Romance (ver programação abaixo), que se propõe a explorar este gênero tão multifacetado e desafiador, que vem espelhando a humanidade e pondo a nu, sem reservas, seus aspectos mais belos e sórdidos. As obras selecionadas para este ciclo se encontram no plano dos textos de ruptura, que problematizam as delimitações deste gênero, que colocam seus leitores em estado de perda, que desconfortam, que fazem vacilar as bases históricas, culturais e psicológicas de todos aqueles que deles ousam se aproximar em demasia. São uma ameaça para a consistência de nossos gostos, valores e lembranças, pois fazem entrar em crise nossa relação com a linguagem.

Datas, obras e professores palestrantes:
22/02 - Ulysses, de James Joyce, com Caetano Galindo.
22/03 - O Processo, de Franz Kafka, com Paulo Soethe.
05/04 - A Paixão Segundo GH, de Clarice Lispector, com Lucia Cherem. 
26/04 - As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino, com Ernani Fritoli.
17/05 - Madame Bovary, de Gustave Flaubert, com Sandra Stroparo.
07/06 - O Som e a Fúria, de William Faulkner, com Luci Collin. 
16/08 - Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, com Rodrigo Machado.
30/08 - O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago, com Marcelo Sandmann.
13/09 - Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, com Marilene Weinhardt. 
27/09 - Satyricon, de Petrônio, com Rodrigo Gonçalves. 
25/10 - Cem anos de Solidão, de Gabriel Garcia Márquez, com Isabel Jasinski.
22/11 - Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, com Paulo Soethe. 

* Lúcia Cherem possui graduação em Letras Português - Francês pela Universidade Federal do Paraná (1982) e doutorado em Letras (Literatura Comparada) pela Universidade de São Paulo (2003) e com bolsa sanduíche na Universidade do Quebec, em Montreal, com uma tese sobre Clarice Lispector. Atualmente é professora de língua e literatura francesa da Universidade Federal do Paraná. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Línguas Estrangeiras Modernas, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino da leitura, língua estrangeira e literatura brasileira. Concluiu seu pós-doutorado na Universidade Estadual de Campinas, em agosto de 2013.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Cine Fap: "Le Garçu", de Maurice Pialat


O último filme de Pialat é um dos raros “últimos filmes” realmente testamentários. Como alter ego do cineasta, Gérard Depardieu encarna um homem de meia idade às voltas com a ex-mulher, o filho pequeno (o papel coube ao próprio filho de Pialat) e a morte do pai. Um filme cujo protagonista é confrontado com o seu passado e com o que ficará depois dele, e no qual Pialat retomou o estilo directo e “brutalista” que caracteriza quase todo o seu cinema e do qual se afastara nos dois filmes anteriores.

Serviço:
dia 31/03 (segunda)
às 19 hs
no Auditório Antonio Melilo
(Rua dos Funcionários, 1357, Cabral) 
ENTRADA FRANCA

Realização: Cine FAP e HATARI! (Grupo de Estudos de Cinema)
Apoio: Coletivo Atalante

segunda-feira, 24 de março de 2014

Van Gogh


1992
O Van Gogh de Pialat não segue a maior parte das regras tradicionalmente usadas em filmes de ficção sobre alguma personalidade famosa: não dramatiza os momentos-chave da vida dele, não mostra suas pinturas prontas (!), não trata o personagem principal como uma espécie de herói (ele é um homem considerado ridículo pelos valores dominantes da sociedade), tampouco faz questão de exaltar o aspecto genial de seu trabalho. Portanto, longe da oficialidade insípida de uma mera “reconstituição biográfica sobre um ícone respeitável”, Van Gogh é um amontoado de fragmentos constituídos por momentos vividos por pessoas comuns (logo, pessoas com muitas debilidades e fraquezas; pessoas com disposição a praticarem tanto o Bem quanto o Mal. Pessoas de carne e osso, enfim).
O sentimento dos espectadores tende a ser algo próximo a de uma frustração: por Van Gogh ser um ícone cultural hoje reconhecido como “nobre” ou “genial”, é inevitável que esperemos do filme indícios dessa nobreza ou dessa genialidade. Estas, não apenas estão completamente ausentes, como também a construção do personagem em nenhum momento faz questão de evocar no espectador alguma simpatia por ele. Fatos biográficos notórios, como a orelha auto-decepada, a convivência sexual com Marguerite Gachet, a rivalidade com o irmão Theo, tudo parece ter a mesma (des) importância.  Assim como na vida fora do cinema, nada é excepcional (ou, tudo o é): as coisas passam sem alarde, principalmente aquelas que são essenciais. Nunca percebemos as coisas essenciais no exato momento em que elas acontecem.
Essa não-representação do ícone Van Gogh tal qual o conhecemos não é pouca coisa, visto que o filme é obra do final do século XX, época da consolidação da vitória da sociedade do espetáculo, sociedade essa na qual as imagens já são em sua maioria imagens reprocessadas, ou seja, imagens criadas a partir de outras imagens. A título de exemplo, porém evitando maiores comparações, o Amadeus de Milos Forman é um filme baseado no livro de Peter Schafer, que por sua vez é um livro baseado em documentos e outros objetos. O que Pialat tenta fazer em Van Gogh é eliminar essas intermediações. Permanecendo o mais distante possível das imagens clichês, Pialat as coloca em crise simplesmente por ignorá-las. Ele tenta ir direto ao ponto, ser muito objetivo e nada subjetivo. Prioriza as interações mais quotidianas entre os personagens, sem alarde, encenando cenas que estão muito próximas da vida que conhecemos, aquela que esconde os sentimentos e sentidos mais profundos atrás das aparências mais banais e opacas possíveis.
Percebe-se que Van Gogh era um homem como os outros, ou até mesmo um homem considerado pior em relação aos outros. Alguém considerado inútil para a sociedade vigente. Tido por louco, estranho. Fracassou em tudo. E, apesar da genialidade em pintar, apesar desse legado monstruoso que é a sua arte, o cinema não pode reparar a existência miserável (materialmente e humanamente falando) que ele teve; o cinema é insuficiente diante da vida vivida de forma direta e que escoa banalmente e discretamente no dia-a-dia. Humildade exemplar do cineasta, que realizou com muita dificuldade (três anos de filmagem, falência da produtora de Daniel Toscan, troca de quase toda a equipe durante o percurso) um filme que é um verdadeiro milagre.

Fernando Watanabe
(texto original: 
http://www.revistainterludio.com.br/?p=3459 )

sábado, 22 de março de 2014

Cineclube Sesi: "O Ataque do Presente Contra o Resto do Tempo" de Alexander Kluge


É possível dividir o século XX em planos quadrienais? Que relação existe entre a cultura e o comércio de sucata? Qual é o poder dos meios de comunicação de massa? Uma jovem médica se sente desnecessária. Uma família se senta diante de seu computador como se estivesse defronte de uma lareira. Um apressado. Pessoas se separam. Uma educadora (Jutta Hoffmann) precisa entregar a parentes uma criança que perdeu os pais e de quem ela cuidou durante um ano. Ao ver a forma como a criança é recebida, resolve mantê-la consigo. Por fim, a história do diretor de cinema cego. Ele perdeu a visão durante os trabalhos de filmagem e roda seu mais belo filme. O presente se enfatua. Mas sem a história pregressa e o futuro, sobretudo na forma de possibilidade, não existe realidade: o ataque do presente contra o resto do tempo.
Fonte: http://www.witz.com.br/alexanderkluge/ataque.html


Comentários: Cristiane Senn

Serviço:

dia 27/03 (quinta)
às 19h30
na Sala Multiartes do Centro Cultural do Sistema Fiep
(Av. Cândido de Abreu, 200, Centro Cívico)


ENTRADA FRANCA
 


Realização: Sesi 
   
   (
http://www.sesipr.org.br/cultura/)
Produção: Atalante (http://coletivoatalante.blogspot.com.br/)

sexta-feira, 21 de março de 2014

Cine Fap: "Van Gogh", de Maurice Pialat


Pialat se concentra nos últimos 67 dias de vida de Van Gogh. No final da primavera de 1890, o pintor se muda para Auvers-sur-Oise, onde se hospeda sob os cuidados do Dr. Gachet. Acompanhamos seu envolvimento amoroso com a filha do Dr. Gachet e seu relacionamento conturbado com o irmão Theo. Com uma linda fotografia que remete às obras de Renoir e Manet, Pialat realiza um fascinante retrato da vida íntima e do cotidiano desse genial artista.

Serviço:
dia 24/03 (segunda)
às 19 hs
no Auditório Antonio Melilo
(Rua dos Funcionários, 1357, Cabral) 
ENTRADA FRANCA

Realização: Cine FAP e HATARI! (Grupo de Estudos de Cinema)
Apoio: Coletivo Atalante

quinta-feira, 20 de março de 2014

“Iracema”, por uma semana



Edição de 23/01/2011
Filme narra a aventura entre dois brasis desiguais. foi proibido pela ditadura e pode ser visto de graça em Belém.

Miguel Haoni
Especial para o jornal Amazônia
 "Iracema - Uma transa amazônica", filme de 1974 (censurado no Brasil até 1981), dirigido por Jorge Bodanzky e Orlando Senna, será exibido durante esta semana no Cine Olympia, às 18h30, com entrada franca. Um encontro peculiar.
De um lado temos a opulência da "Belém do já-teve", símbolo do falso fausto da Belle Époque, representação máxima dos rituais burgueses, dos tapetes vermelhos e daquilo que historicamente chamam de "vestir-se para ir ao cinema". Do outro, um retrato cruel e sincero de um Brasil (o nosso) marcado pela miséria, pela luta diária por comida e pelas estradas do abandono.
"Iracema..." é uma obra revolucionária que precisa ser revisitada sempre, pois além de guardar imagens importantes do estado do Pará (território afirmado pela segurança nacional, mas desprezado pelo desenvolvimentismo da ditadura militar), é uma aula de método cinematográfico.
O filme narra o encontro de dois brasis carregados na carne dos personagens principais. Paulo César Pereio, grande personalidade do cinema brasileiro, é Tião Brasil-Grande, um carreteiro gaúcho que tenta a sorte nas estradas do Norte transportando madeira e pregando os chavões ufanistas dos anos 70. "Ninguém segura esse país" diz ele enquanto passeia pela paisagem de guerra do subdesenvolvimento. O personagem encontra num prostíbulo em Belém a maravilhosa Iracema, interpretada num desempenho hiperrealista por Edna de Cássia, a mulher-bebê cabocla, que representa o sonho logrado de uma terra prostituída. Depois do encontro, a aventura.
A trajetória dos personagens pelas estradas paraenses é só o pivô de uma aventura muito maior. A equipe de filmagem que topou este desafio, capitaneados pelos cineastas Bodanzky & Senna tinha uma ideia muito particular de realização: o filme seria o amálgama absoluto entre o documentário e a ficção.

Um documentário-ficção revolucionário, produzido em 1974

O filme recupera o cine-olho do cineasta russo Dziga Vertov ("O homem com a câmera"). Um dos mestres pioneiros do documentário, Vertov tinha como princípio a tomada de assalto da realidade, sem efeitos, para a posterior recriação na mesa de montagem. A realidade aqui flagrada é a de um povo abandonado pelo poder público, país que o cineasta Glauber Rocha ("Deus e o Diabo na Terra do Sol") chamava de Brasil pré-histórico em oposição ao Brasil moderno de Rio e São Paulo.
"Iracema..." recria o método da entrevista confrontando personagens semi-fictícios com a realidade dos trabalhadores paraenses, antecipando a tendência do falso-documentarismo norte-americano de Michael Moore ("Fahrenheit 11 de Setembro") ou Sacha Baron Cohen ("Borat - O segundo melhor repórter do glorioso país Cazaquistão viaja à América"). Aqui, entretanto a verdade domina a tela e o efeito câmera, recorrente nos documentários, que modifica o comportamento dos entrevistados, acentua ainda mais o sentido do improviso e da urgência na captação das imagens. Os passantes que olham diretamente para a câmera atribuindo à equipe de filmagem uma corporeidade dramática são sempre bem vindos.
O filme, que teve uma co-produção alemã, trouxe as primeiras imagens das queimadas da floresta amazônica a correr o mundo e foi fundamental para o fortalecimento do movimento ambientalista mundial. Também é notável o registro de vários fenômenos como o Círio de Nossa Senhora de Nazaré e o transporte do açaí na embarcação a motor.
Não é, entretanto um filme de imagens belas, mas sim de imagens fortes, que provocou e ainda provoca reações de horror aos obedientes asseclas da ditadura do "plasticamente correto". "Iracema..." é uma anti-Amelie Poulain. Sua dor é real e representa no corpo as feridas de uma região.

As imagens finais são premonitórias: a ficção do "Brasil Grande" abandona Iracema à própria realidade, no meio da estrada, rindo prostituída no País dos Banguelas. Imagino que os palavrões ecoarão nas paredes quase seculares do Cine Olympia com muito mais raiva.

quarta-feira, 19 de março de 2014

MEU TIO DA AMÉRICA


de Alain Resnais, Mon Oncle d'Amérique, 1980, França

A) Do filme de Alain Resnais, não sei exatamente o que pensar, mas ao menos que ele mexe em muitas coisas no tocante a uma questão que não se ousa mais fazer: o que é ser francês? E que ele faz persistir, contra pré-julgamentos, irritações, cansaço também (por causa dessa bizarra mistura de ficção sociológica, de tese científica, inserções de cinema antigo), um poder de imaginação de fato desproporcionado à esse cenário: nada, desse quadro de sociedade sombrio, dessa "aula de história" pessimista e dessa comédia à francesa, se sustenta verdadeiramente. O poder do filme está em outro lugar. Ele não age num "conteúdo" (de roteiro, ainda menos de tese), mas nos espaços e durações que ele inventa, entre esse roteiro de intrincações e paralelas, e uma distância que parece filmá-lo como se fosse ficção científica. Mas com um medo, um céu de chumbo que a ficção científica quase não conhece. Esse roteiro desloca em si toda uma época de limbos, de massas de imagens, de latências, silêncios opressores, numa estranha máquina de cinema que filma uma humanidade ainda muito familiar, mas que agora só se parece com o horror de seu futuro, na projeção retroativa de um passado afluente nessas imagens cinzas, essas fotografias.
B) Talvez Resnais seja o mais próximo de Welles, seu discípulo mais independente, mais criador, que transforma todo o problema. Pois, em Welles, um ponto fixo subsiste, mesmo que ele comunique com a terra (contra-plongée). É um presente que se oferece à visão, a morte de alguém, ora dada no começo, ora prefigurada. É também um presente sonoro, a voz de quem recita, a voz off, que constitui um centro radiofônico cujo papel é essencial em Welles. [...] A primeira novidade de Resnais é o desaparecimento do centro ou do ponto fixo. A morte não fixa um atual presente, tantos os mortos que assombram as faixas de passado ("9 milhões de mortos assombram essa paisagem", "200 mil mortos em 90 segundos"). A voz off não é mais central, seja porque ela entra em relações de dissonância com a imagem visual, seja porque ela se divide e se multiplica (as vozes diferentes que dizem "Eu nasci..." em Meu Tio da América). Em regra geral, o presente se põe a flutuar, afetado por incertezas, disperso no vai-e-vem dos personagens, ou já absorvido pelo passado.
C) Naturalmente, a idéia não basta. É impossível saber de partida se ela é boa, e se o escritor que escolhemos saberá desenvolvê-la. É preciso esperar para ter um primeiro texto diante dos olhos. Em seguida, discute-se. Não é sempre agradável, pode custar um tempo, pode-se perceber no meio do caminho que não deu certo. [...] Eu escolho os escritores que me parecem dotados de qualidades dramáticas, que têm o sentido do espetáculo. Eu lhes peço para não pensar na técnica cinematográfica e permanecer fiéis a sua própria linguagem. Se eles possuem verdadeiramente esse senso dramático, eu creio que o trabalho deles produzirá automaticamente imagens cinematográficas originais. O escritor tornar-se-á roteirista. Eu procuro, então, preferencialmente pessoas que ainda não trabalharam para o cinema: é uma garantia de frescor.
A) Enquadrar esse filme distanciado de constatação sociológica (a crise dos quadros nessa fase de mutaçao do capitalismo) seria tão insuficiente quanto reduzi-lo a sua moralidade científica (nossos comportamentos de concorrrência e dominação arruínam a saúde). Se ele se assemelha, mais uma vez, com a ficção científica, é por seu poder de demonstrar (não vejo nele outra lição), num cenário de sociedade contemporânea, que suas construções de espaços e duração são capazes de dar a imaginar um tempo e uma geografia que pode representar, com esse horizonte murado e esse passado cinza, um mundo muito lacunar, uma falta de herdeiros sobre a qual pesa o horror dos limbos, do passado, do futuro, que dão a essa humanidade uma história hojeinimaginável.
D) Grande admirador de O Ano Passado em Marienbad, o cientista Henri Laborit tentou trabalhar com Alain Resnais quando um laboratório farmacêutico lhe propôs filmar um curta-metragem sobre um produto que aumentava a capacidade de memória. O projeto não foi adiante e a partir daí Resnais procurou um produtor para fazer um longa-metragem. Uma vez encontrado, ele pediu a Jean Gruault que escrevesse um roteiro a partir de teses de Henri Laborit misturando relato científico e romanesco.
C) Há os detalhes, e em seguida há a composição. Uma obra pode ser muito realista no detalhe, apoiando-se numa construção formal rigorosa. Observe um quadro de Cézanne: nunca se mostrou melhor a Provence, a paisagem foi apresentada com uma precisão, uma sensibilidade extremas. Ao mesmo tempo, é uma composição abstrata, um jogo de linhas e de formas. A esse respeito, a pintura não-figurativa não modificou nada. Simplesmente, ao invés de partir de um objeto, de uma maçã, de uma árvore, parte-se de um primeiro traço que é colocado arbitrariamente e em torno do qual outros traços se organizam em seqüência. O tema do quadro é o próprio quadro. Talvez se poderia falar de um realismo formalista, se essa mistura de palavras tem um sentido. Tenho a impressão, quando eu filmo, de me prender constantemente aos detalhes. Tento ser tão exato, tão fiel quanto possível. Mas eu não perco jamais de vista o conjunto, a totalidade que é do próprio filme, porque eu sei que para comunicar alguma coisa, é preciso passar pelas formas.
B) Meu Tio da América poderá continuar essa exploração [existente em Hiroshima mon amour, Muriel, A Guerra Acabou] das idades. Três personagens, e cada um tem vários níveis, várias idades. Há constantes: cada idade, cada faixa se definirá por um território, linhas de fuga, obstrução dessas linhas; são as determinações topológicas, cartológicas propostas por Laborit. Mas de uma idade a outra, e de um personagem a outro, a repartição varia. As idades tornam-se idades do mundo, em suas variações, porque elas dizem respeito aos próprios animais, mas também porque elas dizem respeito ao cosmos sobre-humano, a ilha e seu tesouro.
E) A única razão de ser de um ser é ser. Ou seja, manter sua estrutura. É a de se manter vivo. Sem isso, não haveria ser. [...] Um cérebro não serve para pensar, mas para agir.


A: Jean-Pierre Oudart, in Cahiers du Cinéma 314, julho-agosto 1980
B: Gilles Deleuze, Cinema 2. Imagem-Tempo. Paris: Minuit (1ª ed. 1985)
C: Alain Resnais, in L’Arc 31, inverno 1967.
D: Allociné.com (no texto "Sécrets de tournage")
E: Henri Laborit in Meu Tio da América.

Tradução e adaptação: Ruy Gardnier
(texto original:
 http://www.contracampo.com.br/69/meutiodaamerica.htm)

terça-feira, 18 de março de 2014

Cineclube Sesi: "Iracema, Uma Transa Amazônica"

Nesta quinta-feira, dia 20, o Cineclube Sesi apresenta "Iracema, uma Transa Amazônica", de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, seguindo a programação de março que contará ainda com "O Ataque do Presente Contra o Resto do Tempo", de Alexander Kluge, no dia 27.
Sempre com entrada franca!

Cineclube Sesi apresenta:  "Iracema, Uma Transa Amazônica", de Jorge Bodanzky e Orlando Senna

O Brasil é o país dos dilaceramentos. A realidade geopolítica é tão ancorada em disparidades que por vezes o brasileiro se surpreende com um país alienígena, que também é seu. Em 1974, uma equipe de filmagem resolveu mergulhar no desafio de construir uma narrativa tomando esta premissa como base, cujo resultado – o filme “Iracema, uma transa amazônica” – é talvez o trabalho mais inovador sobre os limites entre documentário e ficção já feito.
Paulo César Pereio e Edna de Cássia representam o abismo entre o “Brasil Grande” propagandeado pelo regime e a precariedade do povo que sobrevive à margem da ilusão de progresso. Orlando Senna desenvolve tal roteiro não numa escrita de ferro mas, sobretudo, no suor dos personagens.
Nesta perspectiva destaca-se, entretanto, o cine-olho de Jorge Bodanzky que ao resignificar a “realidade tomada de improviso” vertoviana dá novo sentido ao método da entrevista e das relações entre a equipe de filmagem e o universo registrado/representado.
Reexibir “Iracema” em Belém é oportunidade, não só para celebrar os 35 anos desta obra-prima, como também para reavaliarmos enquanto amazônidas o dilaceramento que abandona no meio da estrada, prostituído e banguela, este Brasil alienígena que sempre foi o nosso.
Miguel Haoni  (APJCC – 2009)

Serviço:

dia 20/03 (quinta)
às 19h30
na Sala Multiartes do Centro Cultural do Sistema Fiep
(Av. Cândido de Abreu, 200, Centro Cívico)


ENTRADA FRANCA
 


Realização: Sesi 
   
   (
http://www.sesipr.org.br/cultura/)
Produção: Atalante (http://coletivoatalante.blogspot.com.br/)

segunda-feira, 17 de março de 2014

Sob o sol de satã


(Sous le Soleil de Satan, 1987)

À primeira vista, Sob o Sol de Satã surpreende os fãs de Pialat acostumados ao olhar bruto e dilacerado de filmes como Aos Nossos Amores, Loulou e Passe Ton Bac d’Abord.  O livro de George Bernanos não oferece somente um cenário diferente das ruas e do universo adolescente que impregna esses filmes. A própria mise en scène aqui é mais controlada, mais estudada, de traço fino, a luz e os movimentos de câmera são suaves. Relativamente fiel ao livro, Pialat deixa que o texto guie os atores. Ao mesmo tempo, ele arquiteta um mundo cinza, sem vida, um universo que conspira, onde as tragédias simplesmente acontecem, corriqueiras.
Primeira manifestação de satã: a câmera faz um discreto giro em 360º passando de Mouchette (Sandrine Bonnaire) a Cadignam (Alain Artur), que entra pela porta e é morto por um tiro de espingarda. A morte é completamente inesperada. O movimento de câmera ajuda a desdramatizar a cena, retirando seu sentido e preservando o choque seco diante do absurdo – algo aconteceu.
Segunda manifestação: Mouchette intimida Gallet (Yann Dedet). Ela fala sem parar, confessa seu crime friamente. Um grito dela encerra a cena – um grito surdo, vazio, a histeria de um corpo que enxerga por um momento a consciência demoníaca que lhe é externa e que a possui.
Vê-se logo que o princípio pialatiano do corpo como entidade deflagradora de intensidades permanece intocado. O que é Donissan (Gerard Depardieu) senão um corpo moribundo? Como pároco, ele é incapaz de cumprir o papel social que esperam dele (“No seminário, era um aluno medíocre. Inteligência, memória, assiduidade, tudo me faltava”). Donissan é tão somente uma massa, um corpo que vaga em busca da iluminação divina ou da perdição do inferno.
Se o corpo permanece, o que muda em Sob o Sol de Satã, então, é sobretudo a linguagem: sai o documentário, entra a adaptação. No lugar do furor e da contaminação pelo mundo, Pialat impõe um registro árido, que nos deixa ver a própria transparência do mal por trás daqueles corpos sem vida e daquelas paisagens cinzas e despovoadas. Palma de Ouro mais do que merecida.

Calac Nogueira
(texto original: http://www.revistainterludio.com.br/?p=3457)

HATARI!: "O Meu Tio da América" (homenagem a Alain Resnais)

HATARI! - Grupo de Estudos de Cinema apresenta: "O Meu Tio da América" (em homenagem à Alain Resnais)


O filme conta a história de três personagens, René (Gérard Depardieu) que é um ex-fazendeiro que se torna gerente de uma empresa que passa por um período de corte de funcionários, Janine que é uma atriz talentosa envolvida com um homem casado que conheceu em um dos seus espetáculos e Jean que é um escritor e político em ascenção, insatisfeito com sua vida pessoal e que precisa tomar decisões importantes em sua vida. Durante a trama os atos dos personagens são utilizado para ilustrar as teorias do comportamento humano do professor Henri Laborit que aparece no filme como narrador. O filme que mistura ficção e documentário foi premiado na França e indicado ao oscar de melhor filme estrangeiro em 1981.

Serviço:
dia 19/03 (quarta)
às 19 hs
no Auditório Antonio Melilo
(Rua dos Funcionários, 1357, Cabral) 
ENTRADA FRANCA

Realização:HATARI! (Grupo de Estudos de Cinema)
Apoio: Coletivo Atalante

domingo, 16 de março de 2014

Poiesis: O Processo, de Franz Kafka, com Paulo Soethe

O Processo, de Franz Kafka, com Paulo Soethe (sobre Paulo, ler abaixo).

O Poiesis é um evento de extensão da UFPR, organizado pelo Coletivo Atalante e sob a coordenação do professor Benito Rodrigues. Consiste em ciclos de palestras sobre grandes clássicos da literatura mundial, sendo tais palestras conduzidas por professores da UFPR, especialistas em tais obras. Por outro lado, este evento também faz parte de um esforço da universidade em abrir-se para a comunidade não acadêmica, fazendo circular um saber geralmente restrito ao público da academia. Todas as palestras ocorrem sábado à tarde, da 14 às 18 horas na Reitoria.
Estamos no segundo ciclo, O Romance (ver programação abaixo), que se propõe a explorar este gênero tão multifacetado e desafiador, que vem espelhando a humanidade e pondo a nu, sem reservas, seus aspectos mais belos e sórdidos. As obras selecionadas para este ciclo se encontram no plano dos textos de ruptura, que problematizam as delimitações deste gênero, que colocam seus leitores em estado de perda, que desconfortam, que fazem vacilar as bases históricas, culturais e psicológicas de todos aqueles que deles ousam se aproximar em demasia. São uma ameaça para a consistência de nossos gostos, valores e lembranças, pois fazem entrar em crise nossa relação com a linguagem.
Em se tratando de Franz Kafka, todo enfileiramento sinonímico para ruptura e subversão é pouco... Obra situada no limiar dos possíveis, verdadeira afronta à racionalidade, os textos de Kafka (em especial O Processo, O Castelo e a Metamorfose) dispõem sobre o embotado de nossas percepções uma malha imaginária delirante que nos ameça. Obra tecida à semelhança de um espelho esférico que inverte nosso bem situado reflexo para transformar o paraíso de nossas certezas no inferno neurótico de nossas dúvidas, Kafka acabou fundando um eterno e angustiante enigma - que não admite decifração - cuja existência é tão intolerável que, quase invariavelmente, fechamos o livro e aguardamos, ansiosos, o retorno à nossa normalidade... que nunca mais há de ser a mesma.

Trecho de O Processo:

Imperativo, o Sacerdote grita:

"- Josef K. !
K. estacou e olhou para o chão diante dele. No momento ainda estava livre, ainda podia continuar andando e escapulir por uma das três pequenas portas escuras de madeira à sua frente, não muito distantes. Isso significaria que não havia entendido (o chamado), ou que na verdade havia entendido, mas não queria levá-lo em consideração. Caso, porém, se voltasse, estava preso, pois então teria confessado que entendera muito bem que era de fato a pessoa chamada e que também iria obedecer. Se o sacerdote tivesse chamado outra vez, K. certamente teria ido embora, mas como tudo ficou em silêncio, virou um pouco mais a cabeça enquanto esperava, pois queria ver o que o sacerdote estava fazendo naquele momento. Ele estava no púlpito, calmo como antes, mas podia-se ver nitidamente que tinha percebido o movimento de cabeça de K. Seria um jogo de esconde-esconde infantil se agora K. não voltasse completamente a cabeça. Ele o fez e, com um aceno de dedo, foi chamado para mais perto pelo sacerdote. Uma vez que agora tudo podia acontecer abertamente, ele correu - também por curiosidade e para encurtar o assunto - com passos longos, que voavam ao encontro do púlpito. Junto aos primeiros bancos ele parou, mas a distancia ainda parecia grande demais para o sacerdote, que estendeu a mão e, com o indicador severamente inclinado para baixo, apontou para um lugar logo à frente do púlpito. K. obedeceu também a isso; naquele lugar tinha que curvar a cabeça bem para trás, para ainda enxergar o sacerdote".

Datas, obras e professores palestrantes:
22/02 - Ulysses, de James Joyce, com Caetano Galindo.
22/03 - O Processo, de Franz Kafka, com Paulo Soethe.
05/04 - A Paixão Segundo GH, de Clarice Lispector, com Lucia Cherem.
26/04 - As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino, com Ernani Fritoli.
17/05 - Madame Bovary, de Gustave Flaubert, com Sandra Stroparo.
07/06 - O Som e a Fúria, de William Faulkner, com Luci Collin.
16/08 - Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, com Rodrigo Machado.
30/08 - O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago, com Marcelo Sandmann.
13/09 - Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, com Marilene Weinhardt.
27/09 - Satyricon, de Petrônio, com Rodrigo Gonçalves.
25/10 - Cem anos de Solidão, de Gabriel Garcia Márquez, com Isabel Jasinski.
22/11 - Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, com Paulo Soethe.

Paulo Soethe é graduado em Letras Alemão-Português pela Universidade Federal do Paraná (1989), mestre (1995) e doutor (1999) em Letras (Língua e Literatura Alemã) pela Universidade de São Paulo. Durante o doutorado, realizou estágio de pesquisa de um ano na Universidade de Tübingen em 1998/99 como bolsista Capes/DAAD. Também na Universidade de Tübingen, Alemanha, cumpriu pós-doutorado (14 meses, em 2005/2006) como bolsista da Fundação Alexander von Humboldt. Desde 1992 é docente de ensino superior da Universidade Federal do Paraná, na graduação em Letras e no Programa de Pós-graduação em Letras. Na UFPR dirige o Centro de Cooperação Internacional Brasil-Alemanha (CCIBA). É presidente da Associação Latino-americana de Estudos Germanísticos (ALEG). Integra conselhos consultivos das revistas Terra Roxa e Outras Terras (UEL), Fragmentos (UFSC), Pandaemonium Germanicum (USP) e Revista de Filología Alemana (Univ. Complutense de Madrid). É membro do conselho de editores do Jahrbuch für internationale Germanistik, como representante da América Latina. Traduz literatura e filosofia alemã para o português, com destaque para autores como Karl-Otto Apel, Jürgen Habermas, Heinrich Böll e Aleida Assmann. Atua na área de Letras, com ênfase em Literatura de Língua Alemã, dedicando-se em especial aos seguintes temas: espaço literário, relações interculturais entre Brasil e Alemanha, Guimarães Rosa, Thomas Mann e literatura e ética. (Texto informado pelo autor)

sexta-feira, 14 de março de 2014

Cine Fap: "Sob o Sol de Satã", de Maurice Pialat


Dossignan é um sacerdote muito zeloso de uma paróquia rural. O seu superior Menou-Segrais sempre tenta ajudá-lo em suas dúvidas, porém, numa ocasião Dossignan será tentado pelo Satanás e não poderá pedir ajuda. Ele tentará salvar a alma de Mouchette, uma jovem que matou um de seus amantes. Palma de Ouro no Festival de Cannes.

Serviço:
dia 17/03 (segunda)
às 19 hs
no Auditório Antonio Melilo
(Rua dos Funcionários, 1357, Cabral) 
ENTRADA FRANCA

Realização: Cine FAP e HATARI! (Grupo de Estudos de Cinema)
Apoio: Coletivo Atalante

quinta-feira, 13 de março de 2014

Comédia? Ficção Científica? Fantasia? Genialidade?


Funky Forest: The First Contact combina vinte e um curtas que parecem não ter nenhuma relação entre si, todavia, à medida que se sucedem, se vão ligando, como a vida de seus personagens, em uma história que os abarca a todos.
Takefumi e Nocchi, que não sabem se estão ou não noivos e cujas frustrações aparecem em sonhos. Três garotas que pasam uma tarde contando-se histórias, como a do extraterrestre Piko-Riko, relatada pelo excêntrico Takefumi, que jura ter estado em um OVNI. Um convescote para solteiras e solteiros que resulta um fiasco porque não vai nenhuma mulher. Uma garota que se encontra com uns garotos que conectam seu umbigo a uma máquina com uma abertura anal por onde sai um pequeno cozinheiro de sushi. Uma professora ginasial chamada Masaru que está a cargo de um centro de atividades para estudantes onde as crianças jogam badminton com testículos e criaturas que chupam sangre.
Pastiche em que se mesclam peças de anime com capítulos de humor e números musicais de uma espécie de música electrónica Cut-Up ou Sampling, gênero influenciado pela técnica de colagem de Merz (Kurt Schwitters, 1919), a literatura cut-up de Burroughs, o dada e o surrealismo. A Opera se divide em dois caras ou partes, Cara A e Cara B, interrompidos por eclécticas intermissões musicais estruturadas em capítulos de humor que a modo de sketches ou blocos conceituais repetem e variam algumas de suas partes. Algumas destas mesmas parecem estar directamente influenciadas por uma espécie de fusão entre o situacionismo, a performance e o Cronenberg mais "transhumanista". Continuação de O Sabor do Chá que, vistos em conjunto, extendem-se até cinco horas.
A exemplo de outros espécimes do cinema japonês contemporâneo, como O Gigante do Japão, mockmentary-reality-show de um homem sub-empregado que fica gigante através  de um processo científico e enfrenta monstros numa atração televisiva, com referências que vão de Godzilla, Dragon Ball e Ultraman à crítica social e econômica e aos tabus sexuais  e O Sabor do Chá, filme anterior de Katsuhito Ichii que homenageia o cinema de costumes clássico japonês, no qual a familia é a base de criação de histórias mínimas, Funky Forest: The First Contact é um medley de nonsense, grotesco, freak, livre-associação, bizarro, bobo, inconveniente, tabu, ridículo, que satiriza os usos e costumes de um povo exemplar e suas maneiras ontológicas caracterização midiática.
Com olhar ocidental, pode-se identificar os bonecos de resina e silicone dos filmes de David Croenenberg, o humor auto-referente e erudito de Monty Phyton, as caricaturas e escritos satíricos modernos, medievais e antigos europeus, a cultura pop do karaoke, do ukiyo, do anime do mangaka.
O Japão é o país em que a economia e a cultura funcionam às avessas do resto do mundo. Em sua cultura pop, o capitalismo triunfante desembaraçado dos tabus ocidentais e permeados por contingências diversas propicia uma propedêutica que nos leva a uma serendipicidade muito além dos nossos conceitos de "seriedade" artística e estética.

Igor Viana Müller
(frequentador do Cineclube Sesi)

Mini-curso de cinema clássico brasileiro

- INSCRIÇÕES ENCERRADAS - 

Dando prosseguimento ao que foi iniciado com as Oficinas de Formação de 2013 (cineclube, cinema na escola e crítica), o Sesi oferecerá em 2014 mini-cursos mensais sobre diversos capítulos da teoria e da história do cinema. 
Ministrados pelo cineclubista Miguel Haoni, do Coletivo Atalante, os mini-cursos terão carga horária de 8 horas, inscrições gratuitas e vagas limitadas.

O mini-curso de março pretende investigar um capítulo desprezado da cinematografia brasileira: como cineastas nacionais adaptavam a linguagem clássica para o seu contexto? Quais os projetos estéticos nos melodramas da Vera Cruz e nas chanchadas da Atlântida? Em qual tradição discursiva se insere o cinema de Mazzaroppi e Renato Aragão? Estas questões (e não só), serão a base norteadora do mini-curso.

Unidades:
1 - Do Cinematógrafo ao Cinema Novo
2 - As convenções do filme clássico
3 - Banditismo e espetáculo
4 - A paródia

Referências:
GOMES, Paulo Emílio Salles. Cinema: trajetória no subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
XAVIER, Ismail. Sertão Mar. São Paulo: Cosac Naify, 2007.
VIEIRA, João Luiz. "Este é meu, é seu, é nosso - Introdução à paródia no cinema brasileiro". In: Filme Cultura 41/42. Embrafilme, maio de 1983.

Serviço: 
dias 22 e 23 de março (sábado e domingo)
das 14 às 18 horas
no Sesi Heitor Stockler de França
(Avenida Marechal Floriano Peixoto, 458, Centro - Curitiba/PR)   



Realização: Sesi 
  
     (
http://www.sesipr.org.br/cultura/)
Produção: Atalante (http://coletivoatalante.blogspot.com.br/)