O Processo, de Franz Kafka, com Paulo Soethe (sobre Paulo, ler abaixo).
O Poiesis é um evento de extensão da UFPR, organizado pelo Coletivo Atalante e sob a coordenação do professor Benito Rodrigues. Consiste em ciclos de palestras sobre grandes clássicos da literatura mundial, sendo tais palestras conduzidas por professores da UFPR, especialistas em tais obras. Por outro lado, este evento também faz parte de um esforço da universidade em abrir-se para a comunidade não acadêmica, fazendo circular um saber geralmente restrito ao público da academia. Todas as palestras ocorrem sábado à tarde, da 14 às 18 horas na Reitoria.
Estamos no segundo ciclo, O Romance (ver programação abaixo), que se propõe a explorar este gênero tão multifacetado e desafiador, que vem espelhando a humanidade e pondo a nu, sem reservas, seus aspectos mais belos e sórdidos. As obras selecionadas para este ciclo se encontram no plano dos textos de ruptura, que problematizam as delimitações deste gênero, que colocam seus leitores em estado de perda, que desconfortam, que fazem vacilar as bases históricas, culturais e psicológicas de todos aqueles que deles ousam se aproximar em demasia. São uma ameaça para a consistência de nossos gostos, valores e lembranças, pois fazem entrar em crise nossa relação com a linguagem.
Em se tratando de Franz Kafka, todo enfileiramento sinonímico para ruptura e subversão é pouco... Obra situada no limiar dos possíveis, verdadeira afronta à racionalidade, os textos de Kafka (em especial O Processo, O Castelo e a Metamorfose) dispõem sobre o embotado de nossas percepções uma malha imaginária delirante que nos ameça. Obra tecida à semelhança de um espelho esférico que inverte nosso bem situado reflexo para transformar o paraíso de nossas certezas no inferno neurótico de nossas dúvidas, Kafka acabou fundando um eterno e angustiante enigma - que não admite decifração - cuja existência é tão intolerável que, quase invariavelmente, fechamos o livro e aguardamos, ansiosos, o retorno à nossa normalidade... que nunca mais há de ser a mesma.
Trecho de O Processo:
Imperativo, o Sacerdote grita:
"- Josef K. !
K. estacou e olhou para o chão diante dele. No momento ainda estava livre, ainda podia continuar andando e escapulir por uma das três pequenas portas escuras de madeira à sua frente, não muito distantes. Isso significaria que não havia entendido (o chamado), ou que na verdade havia entendido, mas não queria levá-lo em consideração. Caso, porém, se voltasse, estava preso, pois então teria confessado que entendera muito bem que era de fato a pessoa chamada e que também iria obedecer. Se o sacerdote tivesse chamado outra vez, K. certamente teria ido embora, mas como tudo ficou em silêncio, virou um pouco mais a cabeça enquanto esperava, pois queria ver o que o sacerdote estava fazendo naquele momento. Ele estava no púlpito, calmo como antes, mas podia-se ver nitidamente que tinha percebido o movimento de cabeça de K. Seria um jogo de esconde-esconde infantil se agora K. não voltasse completamente a cabeça. Ele o fez e, com um aceno de dedo, foi chamado para mais perto pelo sacerdote. Uma vez que agora tudo podia acontecer abertamente, ele correu - também por curiosidade e para encurtar o assunto - com passos longos, que voavam ao encontro do púlpito. Junto aos primeiros bancos ele parou, mas a distancia ainda parecia grande demais para o sacerdote, que estendeu a mão e, com o indicador severamente inclinado para baixo, apontou para um lugar logo à frente do púlpito. K. obedeceu também a isso; naquele lugar tinha que curvar a cabeça bem para trás, para ainda enxergar o sacerdote".
Datas, obras e professores palestrantes:
22/02 - Ulysses, de James Joyce, com Caetano Galindo.
22/03 - O Processo, de Franz Kafka, com Paulo Soethe.
05/04 - A Paixão Segundo GH, de Clarice Lispector, com Lucia Cherem.
26/04 - As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino, com Ernani Fritoli.
17/05 - Madame Bovary, de Gustave Flaubert, com Sandra Stroparo.
07/06 - O Som e a Fúria, de William Faulkner, com Luci Collin.
16/08 - Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, com Rodrigo Machado.
30/08 - O Evangelho Segundo Jesus Cristo, de José Saramago, com Marcelo Sandmann.
13/09 - Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, com Marilene Weinhardt.
27/09 - Satyricon, de Petrônio, com Rodrigo Gonçalves.
25/10 - Cem anos de Solidão, de Gabriel Garcia Márquez, com Isabel Jasinski.
22/11 - Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, com Paulo Soethe.
Paulo Soethe é graduado em Letras Alemão-Português pela Universidade Federal do Paraná (1989), mestre (1995) e doutor (1999) em Letras (Língua e Literatura Alemã) pela Universidade de São Paulo. Durante o doutorado, realizou estágio de pesquisa de um ano na Universidade de Tübingen em 1998/99 como bolsista Capes/DAAD. Também na Universidade de Tübingen, Alemanha, cumpriu pós-doutorado (14 meses, em 2005/2006) como bolsista da Fundação Alexander von Humboldt. Desde 1992 é docente de ensino superior da Universidade Federal do Paraná, na graduação em Letras e no Programa de Pós-graduação em Letras. Na UFPR dirige o Centro de Cooperação Internacional Brasil-Alemanha (CCIBA). É presidente da Associação Latino-americana de Estudos Germanísticos (ALEG). Integra conselhos consultivos das revistas Terra Roxa e Outras Terras (UEL), Fragmentos (UFSC), Pandaemonium Germanicum (USP) e Revista de Filología Alemana (Univ. Complutense de Madrid). É membro do conselho de editores do Jahrbuch für internationale Germanistik, como representante da América Latina. Traduz literatura e filosofia alemã para o português, com destaque para autores como Karl-Otto Apel, Jürgen Habermas, Heinrich Böll e Aleida Assmann. Atua na área de Letras, com ênfase em Literatura de Língua Alemã, dedicando-se em especial aos seguintes temas: espaço literário, relações interculturais entre Brasil e Alemanha, Guimarães Rosa, Thomas Mann e literatura e ética. (Texto informado pelo autor)
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