sábado, 5 de maio de 2012

Artigo sobre "Metrópolis" de Fritz Lang (1927)



     Em Metropolis (1927) de Fritz Lang, a cidade tirada do imaginário do diretor aparece como um lugar futurista e superdimensionado. Nela estão presentes duas realidades por assim dizer, nitidamente segregadas pela classe social a que pertencem: trabalhadores e burgueses. Essa exageração dos estereótipos classistas critica claramente o modelo de trabalho vigente na sociedade da época. O interessante disso é dar-se conta da maneira espacial com que é colocado esse exagero - até mesmo porque no cinema mudo as imagens respondiam com maior intenção à idéia que se queria transpassar. Os trabalhadores são simplesmente “jogados” para baixo da terra, vivendo em uma espécie de submundo, trabalhando para que a cidade pulse e cresça com uma autonomia desconcertante. Essa parecera por vezes ter vida própria, com cenas de arranha-céus dividindo espaços com aviões e autopistas suspensas, sem pessoa alguma caminhando e habitando por suas ruas. Não sei se intencional ou não, talvez devido a técnica de filmagem que usava maquetes em escalas menores, mas a ausência de pessoas ou até mesmo elementos naturais (árvores) e lugares de lazer (jardins, praças), fantasiam essa estranha sensação. Aqui fica clara a idéia de que na época já existiam os mesmos problemas que traz a estrutura da cidade e sociedade atualmente, que no filme aparecem de maneira exagerada.
     Essa mesma interpretação é notória no dimensionamento com que são representadas as ruas e quando as personagens contracenam com áreas externas da cidade. As passagens, becos e passeios parecem avantajados, fora da escala humana, sombrios e labirínticos. Se bem observado cenas de esquinas e pontos de encontro quase não existem – se existem. Com isso tomo como exemplo as afirmações de Kevin Lynch (“A Imagem da Cidade”), que faz uso de cinco elementos base para ler e entender a cidade, sendo um deles o “cruzamento”, a esquina. A esquina é um ponto de encontro importantíssimo. Se analisada dessa forma percebe-se que essa auto-referência do encontro não acontece na metrópole de Lang. É uma sensação de não pertencimento de uma cidade ao mesmo tempo intensa e hostil.
     Quando observados os espaços internos podemos ver a inspiração para fazer os objetos (cadeiras, portas, maçanetas, abajures) na Arte Déco e, ainda arrisco dizer, certa semelhança com o estilo Bauhaus. A Bauhaus, vale a pena lembrar, tinha como ideal a combinação da arte e artesanato específicos, com o sistema industrial de larga escala; sistema esse evidenciado no longa-metragem.
     Na arquitetura do filme em si, quando observados principalmente os arranha-céus, nota-se essa inspiração também na Arte Déco, com edifícios que, se tivéssemos que classificar, ficariam entre o ecletismo e o modernismo. A Arte Déco era um movimento artístico que estava em grande desenvolvimento na mesma década, o que não me surpreende a tomada de alguns de seus ideais para a confecção da metrópole, já que a idéia era representar a cidade do futuro. Já o movimento moderno se encaixaria perfeitamente nessa mesma visão, uma vez que Le Corbusier (propulsor do movimento dentro da arquitetura) teorizava a existência do homem perfeito, ou seja: um homem pouco natural, um homem cuja sua perfeição o torna irreal. Essa desumanização da arquitetura, por assim dizer, é reconhecível dentro do filme e abarca o mesmo conceito que Lang trata de demonstrar, onde a tecnologia acaba por distanciar a vivência de um espaço mais natural.

Nara Massena 
(Atalante, 2012)

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