sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O drama em Angelopoulos


Theo Angelopoulos ao longo de seus filmes desenvolveu uma forma radical de tratamento dramático, que lança raízes nos procedimentos formais dos cinemas modernos dos anos 50 e 60 e os levam a um paroxismo.
Dias de 36 (1972)

Seu fascínio pelo cinema do italiano Michelangelo Antonioni o conduziu a um emprego sistemático de tempos mortos, nos quais os tradicionais diálogos (informativos/narrativos) eram substituídos por longos silêncios e caminhadas. Tal escolha obriga o espectador a empreender uma imersão contemplativa nas imagens e em seus atributos visuais abstratos.
Alexandre, O Grande (1980)

Estas imagens não primam por sua função narrativa, não são facilitadoras da ação dramática. Permitem uma leitura (mínima) da trama, mas esgarçam, diluem, suspendem esta trama em nome do impacto pictórico, de maneira a atribuir-lhe uma função secundária dentro dos interesses dos filmes. As ações aqui pesam menos por sua função na estrutura narrativa do que pelo efeito plástico dos movimentos no espaço.
Viagem à Citera (1984)

Entretanto, diferente do cinema político ascético dos anos 70, Angelopulos agrega ao seu projeto estético uma dimensão emocional. Não a emoção dos golpes dramáticos da decupagem clássica, mas uma emoção que transborda da contenção, por determinados procedimentos estéticos.
Paisagem na Neblina (1988)

Angelopoulos cria seus planos (unidades fundamentais de seu trabalho) sobre o vazio. A partir dos deslocamentos da câmera e das marcações dos atores, o plano se preenche e esvazia lentamente até o clímax visual e (às vezes) dramático, podendo a partir daí dar lugar ao plano seguinte ou se transformar em uma composição outra. O jogo de Angelopoulos é o da manipulação dos corpos no espaço, sua arte reside em obter através disto composições emocionalmente densas, plenas de ressonâncias míticas e históricas. A dramaturgia aqui é o fio entre os planos, quase sempre invisível.
O Passo Suspenso da Cegonha (1991)

Angelopoulos é um dos mais rigorosos administradores da visibilidade e suas escolhas exigem a participação ativa de nossos sentidos. Por vezes, os ápices dramáticos de seus planos se desenrolam nas profundezas de espaços recessivos, muito longe da câmera e de nossos olhos. A condução do olhar para pontos de fuga infinitos nos obriga a perceber a rarefação das ações nos espaços, silêncios e durações.
A Eternidade e Um Dia (1998)

Em Angelopoulos, a dramaturgia e a dramaticidade tradicionalmente concebidas – linhas de força na mise em scène clássica – são substituídas por outro repertório expressivo. Monotonia, contenção, distância, atores de costas em lentos e longos deslocamentos, sugerem ao espectador uma outra percepção das imagens, do cinema e do mundo.

Miguel Haoni
(Cineclube Sesi, 2013)

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